Livros de Fernando Pessoa

Tenho dito tantas vezes, quanto sofro sem sofrer, que me canso dos revezes, que sonho só para os não ter.

Sobre o Autor

Fernando Pessoa

Fernando Pessoa foi um poeta e escritor português, nascido em Lisboa. É considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa e da literatura universal.

Melhores Livros de Fernando Pessoa

Mais frases de Fernando Pessoa

Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?

As vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.

Para viajar basta existir.

Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.

Tenho em mim todos os sonhos do mundo

Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.

Haja ou não deuses, deles somos servos.

Ver muito lucidamente prejudica o sentir demasiado. E os gregos viam muito lucidamente, por isso pouco sentiam. De aí a sua perfeita execução da obra de arte.

A arte é a auto-expressão lutando para ser absoluta.

Sentir é criar. Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o universo não tem ideias.

Toda a poesia - e a canção é uma poesia ajudada - reflete o que a alma não tem. Por isso a canção dos povos tristes é alegre e a canção dos povos alegres é triste.

Eu não escrevo em português. Escrevo eu mesmo.

A maioria pensa com a sensibilidade, eu sinto com o pensamento. Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar.

Querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer.

O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela.

Precisar de dominar os outros é precisar dos outros. O chefe é um dependente.

Alguns têm na vida um grande sonho e faltam a esse sonho. Outros não têm na vida nenhum sonho, e faltam a esse também.

O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.

O amor romântico é como um traje, que, como não é eterno, dura tanto quanto dura; e, em breve, sob a veste do ideal que formámos, que se esfacela, surge o corpo real da pessoa humana, em que o vestimos. O amor romântico, portanto, é um caminho de desilusão. Só o não é quando a desilusão, aceite desde o príncipio, decide variar de ideal constantemente, tecer constantemente, nas oficinas da alma, novos trajes, com que constantemente se renove o aspecto da criatura, por eles vestida.

Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas (como a dança e a arte de representar) entretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida - umas porque usam de fórmulas visíveis e portanto vitais, outras porque vivem da mesma vida humana. Não é o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso.

O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.

Tudo o que dorme é criança de novo. Talvez porque no sono não se possa fazer mal, e se não dá conta da vida, o maior criminoso, o mais fechado egoísta é sagrado, por uma magia natural, enquanto dorme. Entre matar quem dorme e matar uma criança não conheço diferença que se sinta.

O verdadeiro sábio é aquele que assim se dispõe que os acontecimentos exteriores o alterem minimamente. Para isso precisa couraçar-se cercando-se de realidades mais próximas de si do que os fatos, e através das quais os fatos, alterados para de acordo com elas, lhe chegam.

Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?

Conformar-se é submeter-se e vencer é conformar-se, ser vencido. Por isso toda a vitória é uma grosseria. Os vencedores perdem sempre todas as qualidades de desalento com o presente que os levaram à luta que lhes deu a vitória. Ficam satisfeitos, e satisfeito só pode estar aquele que se conforma, que não tem a mentalidade do vencedor. Vence só quem nunca consegue.

As nações são todas mistérios. / Cada uma é todo o mundo a sós.

Deus é o existirmos e isto não ser tudo.

Sinto-me nascido a cada momento / Para a eterna novidade do Mundo....

Considerar a nossa maior angústia como um incidente sem importância, não só na vida do universo, mas da nossa mesma alma, é o princípio da sabedoria.

Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.

O provincianismo consiste em pertencer a uma civilização sem tomar parte do desenvolvimento superior dela - em segui-la pois mimeticamente com uma insubordinação inconsciente e feliz.

Tudo que se passa no onde vivemos é em nós que se passa. Tudo que cessa no que vemos é em nós que cessa.

Exteriorizar impressões é mais persuadirmo-nos de que as temos do que termo-las.

Ver e ouvir são as únicas coisas nobres que a vida contém. Os outros sentidos são plebeus e carnais. A única aristocracia é nunca tocar.

Correr riscos reais, além de me apavorar, não é por medo que eu sinta excessivamente - perturba-me a perfeita atenção às minhas sensações, o que me incomoda e me despersonaliza.

Ler é sonhar pela mão de outrem. Ler mal e por alto é libertarmo-nos da mão que nos conduz. A superficialidade na erudição é o melhor modo de ler bem e ser profundo.

O pensamento pode ter elevação sem ter elegância, e, na proporção em que não tiver elegância, perderá a ação sobre os outros. A força sem a destreza é uma simples massa.

O mais alto de nós não é mais que um conhecedor mais próximo do oco e do incerto de tudo.

Amar é cansar-se de estar só: é uma covardia portanto, e uma traição a nós próprios (importa soberanamente que não amemos).

O campo é onde não estamos. Ali, só ali, há sombras verdadeiras e verdadeiro arvoredo.

Todo o homem de ação é essencialmente animado e otimista porque quem não sente é feliz.

Tudo que existe existe talvez porque outra coisa existe. Nada é, tudo coexiste: talvez assim seja certo..

Tudo em nós está em nosso conceito do mundo; modificar o nosso conceito do mundo é modificar o mundo para nós, isto é, é modificar o mundo, pois ele nunca será, para nós, senão o que é para nós..

Nenhum livro para crianças deve ser escrito para crianças.

Podemos morrer se apenas amámos.

Pode ser que nos guie uma ilusão; a consciência, porém, é que nos não guia.

Viver é ser outro. Nem sentir é possível se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir - é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida.

Nunca amamos ninguém. Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos. Isso é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso dado por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma ideia nossa.

Sábio é quem monotoniza a existência, pois então cada pequeno incidente tem um privilégio de maravilha. O caçador de leões não tem aventura para além do terceiro leão. Para o meu cozinheiro monótono uma cena de bofetadas na rua tem sempre qualquer coisa de apocalipse modesto. Quem nunca saiu de Lisboa viaja no infinito no carro até Benfica, e, se um dia vai a Sintra, sente que viajou até Marte. O viajante que percorreu toda a terra não encontra de cinco mil milhas em diante novidade, porque encontra só coisas novas; outra vez a novidade, a velhice do eterno novo, mas o conceito abstracto de novidade ficou no mar com a segunda delas.

A vida é para nós o que concebemos dela. Para o rústico cujo campo lhe é tudo, esse campo é um império. Para o César cujo império lhe ainda é pouco, esse império é um campo. O pobre possui um império; o grande possui um campo. Na verdade, não possuímos mais que as nossas próprias sensações; nelas, pois, que não no que elas vêem, temos que fundamentar a realidade da nossa vida.

O amor é um sonho que chega para o pouco ser que se é.

O povo nunca é humanitário. O que há de mais fundamental na criatura do povo é a atenção estreita aos seus interesses, e a exclusão cuidadosa, praticada sempre que possível, dos interesses alheios.

Para realizar um sonho é preciso esquecê-lo, distrair dele a atenção. Por isso realizar é não realizar..

Nunca sabemos quando somos sinceros. Talvez nunca o sejamos. E mesmo que sejamos sinceros hoje, amanhã podemos sê-lo por coisa contrária.

Despreza tudo, mas de modo que o desprezar te não incomode. Não te julgues superior ao desprezares. A arte do desprezo nobre está nisso.

O gênio, o crime e a loucura, provêm, por igual, de uma anormalidade; representam, de diferentes maneiras, uma inadaptabilidade ao meio.

A bondade é a delicadeza das almas grosseiras.

Ter opiniões é estar vendido a si mesmo. Não ter opiniões é existir. Ter todas as opiniões é ser poeta.

A renúncia é a libertação. Não querer é poder.

Todos temos por onde sermos desprezíveis. Cada um de nós traz consigo um crime feito ou o crime que a alma lhe pede para fazer.

Um homem de génio é produzido por um conjunto complexo de circunstâncias, começando pelas hereditárias, passando pelas do ambiente e acabando em episódios mínimos de sorte.

O mundo é de quem não sente. A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade.

As figuras imaginárias têm mais relevo e verdade que as reais.

A liberdade é a possibilidade do isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo.

O dinheiro é belo, porque é a libertação.

A beleza de um corpo nu só a sentem as raças vestidas. O pudor vale sobretudo para a sensibilidade como o obstáculo para a energia.

A celebridade é uma contradição. Parecendo que dá valor e força às criaturas, apenas as desvaloriza e enfraquece.

A ciência descreve as coisas como são; a arte, como são sentidas, como se sente que são.

O fim da arte inferior é agradar, o fim da arte média é elevar, o fim da arte superior é libertar.

Tudo quanto vive, vive porque muda; muda porque passa; e, porque passa, morre. Tudo quanto vive perpetuamente se torna outra coisa, constantemente se nega, se furta à vida.

A vida prejudica a expressão da vida. Se eu vivesse um grande amor nunca o poderia contar.

A felicidade está fora da felicidade.

Tudo quanto fazemos, na arte ou na vida, é a cópia imperfeita do que pensámos em fazer. Desdiz não só da perfeição externa, senão da perfeição interna; falha não só à regra do que deveria ser, senão à regra do que julgávamos que poderia ser. Somos ocos não só por dentro, senão também por fora, párias da antecipação e da promessa.

A única atitude intelectual digna de uma criatura superior é a de uma calma e fria compaixão por tudo quanto não é ele próprio. Não que essa atitude tenha o mínimo cunho de justa e verdadeira; mas é tão invejável que é preciso tê-la.

A experiência direta é o subterfúgio, ou o esconderijo, daqueles que são desprovidos de imaginação. Os homens de ação são os escravos dos homens de entendimento. As coisas não valem senão na interpretação delas. Uns, pois, criam coisas para que os outros, transmudando-as em significação, as tornem vidas. Narrar é criar, pois viver é apenas ser vivido.

De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos.

Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter; repugna-la-íamos, se a tivéssemos. O perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito.

Falar é ter demasiada consideração pelos outros. Pela boca morrem o peixe e Oscar Wilde.

Ser imoral não vale a pena, porque diminui, aos olhos dos outros, a vossa personalidade, ou a banaliza. Ser imoral dentro de si, cercada do máximo respeito alheio.

Os homens são fáceis de afastar. Basta não nos aproximarmos.

A arte consiste em fazer os outros sentir o que nós sentimos, em os libertar deles mesmos, propondo-lhes a nossa personalidade para especial libertação.

Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência.

Matar o sonho é matarmo-nos. É mutilar a nossa alma. O sonho é o que temos de realmente nosso, de impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso.

Viver não é necessário. Necessário é criar.

A fé é o instinto da ação.

Saber ser supersticioso ainda é uma das artes que, realizadas a auge, marcam o homem superior.

A única maneira de teres sensações novas é construíres-te uma alma nova.

Saber interpor-se constantemente entre si próprio e as coisas é o mais alto grau de sabedoria e prudência.

Conhece alguém as fronteiras à sua alma, para que possa dizer - eu sou eu?

Outras vezes oiço passar o vento, E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido.

O Homem é do tamanho do seu sonho.

Todo o prazer é um vício, porque buscar o prazer é o que todos fazem na vida, e o único vício negro é fazer o que toda a gente faz.

Eu sou aquilo que perdi.

Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.

Nada há que tão notavelmente determine o auge de uma civilização, como o conhecimento, nos que a vivem, da esterilidade de todo o esforço, porque nos regem leis implacáveis, que nada revoga nem obstrui. Somos, porventura, servos algemados ao capricho de deuses, mais fortes porém não melhores que nós, subordinados, nós como eles, à regência férrea de um Destino abstracto, superior à justiça e à bondade, alheio ao bem e ao mal.

Nenhuma ideia brilhante consegue entrar em circulação se não agregando a si qualquer elemento de estupidez. O pensamento colectivo é estúpido porque é colectivo: nada passa as barreiras do colectivo sem deixar nelas, como real de água, a maior parte da inteligência que traga consigo.

Os críticos podem dizer que determinado poema, longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos pois que conservar o dia bom em memória florida e prolixa, e assim constelar de novas flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e passageira.

A consciência da inconsciência da vida é o mais antigo imposto à inteligência. Há inteligências inconscientes - brilhos do espírito, correntes do entendimento, mistérios e filosofias - que têm o mesmo automatismo que os reflexos corpóreos, que a gestão que o fígado e os rins fazem de suas secreções.

Sou um guardador de rebanhos, O rebanho é os meus pensamentos E os meus pensamentos são todos sensações. Penso com os olhos e com os ouvidos E com as mãos e os pés E com o nariz e a boca. Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la E comer um fruto é saber-lhe o sentido. Por isso quando num dia de calor Me sinto triste de gozá-lo tanto, E me deito ao comprido na erva, E fecho os olhos quentes, Sinto todo o meu corpo deitado na realidade, Sei a verdade e sou feliz.

Não sei quantas almas tenho Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei. De tanto ser, só tenho alma. Quem tem alma não tem calma. Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que sou e vejo, Torno-me eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo É do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem; Assisto à minha passagem, Diverso, móbil e só, Não sei sentir-me onde estou. Por isso, alheio, vou lendo Como páginas, meu ser. O que segue não prevendo, O que passou a esquecer. Noto à margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo: Fui eu ? Deus sabe, porque o escreveu.

Para sêr grande, sêr inteiro; nada teu exagera ou exclui; sêr todo em cada coisa; põe quanto és no mínimo que fazes; assim em cada lago, a lua toda brilha porque alta vive.

O verdadeiro cadáver não é o corpo (...), mas aquilo que deixou de viver(...)

Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol. Ambos existem; cada um como é.

Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão...

Ah, a Esta Alma Que Não Arde AH, a esta alma que não arde . Não envolve, porque ama, A esperança, ainda que vã, O esquecimento que vive Entre o orvalho da tarde. E o orvalho da manhã

Eu amo tudo o que foi Tudo o que já não é A dor que já não me dói A antiga e errônea fé O ontem que a dor deixou O que deixou alegria Só porque foi, e voou E hoje é já outro dia.

Tuda vale a pena quando a alma não é pequena

... Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque ama, nem o que é amar Amar é a eterna inocência, E a única inocência, não pensar...

Porque eu sou do tamanho do que vejo E não, do tamanho da minha altura...

Boa é a vida, mas melhor é o vinho. O amor é bom, mas é melhor o sono.

Ah, a Esta Alma Que Não Arde AH, a esta alma que não arde . Não envolve, porque ama, A esperança, ainda que vã, O esquecimento que vive Entre o orvalho da tarde. E o orvalho da manhã

Creio no mundo como num malmequer, Porque o vejo. Mas não penso nele Porque pensar é não compreender... O Mundo não se fez para pensarmos nele (Pensar é estar doente dos olhos) Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo... Eu não tenho filosofia; tenho sentidos... Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é, Mas porque a amo, e amo-a por isso Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe por que ama, nem o que é amar...

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

Noite Ó noite onde as estrelas mentem luz, ó noite, única coisa do tamanho do universo, torna-me, corpo e alma, parte do teu corpo, que eu me perca em ser mera treva e me torne noite também, sem sonhos que sejam estrelas em mim, nem sol esperado que ilumine do futuro.

AUTOPSICOGRAFIA O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que lêem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm. E assim nas calhas da roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda Que se chama o coração.

Entre o luar e o arvoredo Entre o luar e o arvoredo, Entre o desejo e não pensar Meu ser secreto vai a medo Entre o arvoredo e o luar. Tudo é longínquo, tudo é enredo. Tudo é não ter nem encontrar. Entre o que a brisa traz e a hora, Entre o que foi e o que a alma faz, Meu ser oculto já não chora Entre a hora e o que a brisa traz. Tudo não foi, tudo se ignora. Tudo em silêncio se desfaz.

Segue o teu destino, Rega as tuas plantas, Ama as tuas rosas. O resto é a sombra De árvores alheias. A realidade Sempre é maios ou menos Do que nós queremos. Só nós somos sempre Iguais a nós própios. Suave é viver só Grande e nobre é sempre Viver simplesmente. Deixa a dor nas aras Como ex-voto aos deuses. Ricardo Reis

Quero ignorado, e calmo Por ignorado, e próprio Por calmo, encher meus dias De não querer mais deles. Aos que a riqueza toca O ouro irrita a pele. Aos que a fama bafeja Embacia-se a vida. Aos que a felicidade É sol, virá a noite. Mas ao que nada espera Tudo que vem é grato.

Passado Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rasto, Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão. A ave passa e esquece, e assim deve ser. O animal, onde já não está e por isso de nada serve, Mostra que já esteve, o que não serve para nada. A recordação é uma traição à natureza, Porque a natureza de ontem não é natureza. O que foi não é nada, e lembrar é não ver. Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!

Como é por dentro outra pessoa Quem é que o saberá sonhar? A alma de outrem é outro universo Com que não há comunicação possível, Com que não há verdadeiro entendimento. Nada sabemos da alma Senão da nossa; As dos outros são olhares, São gestos, são palavras, Com a suposição de qualquer semelhança No fundo.

MAR PORTUGUÊS Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar! Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quere passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.

Basta Pensar em Sentir Basta pensar em sentir Para sentir em pensar. Meu coração faz sorrir Meu coração a chorar. Depois de parar de andar, Depois de ficar e ir, Hei de ser quem vai chegar Para ser quem quer partir. Viver é não conseguir.

Deixei atrás os erros do que fui Deixei atrás os erros do que fui, Deixei atrás os erros do que quis E que não pude haver porque a hora flui E ninguém é exato nem feliz. Tudo isso como o lixo da viagem Deixei nas circunstâncias do caminho, No episódio que fui e na paragem, No desvio que foi cada vizinho. Deixei tudo isso, como quem se tapa Por viajar com uma capa sua, E a certa altura se desfaz da capa E atira com a capa para a rua.

Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas, Quanto mais personalidades eu tiver, Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver, Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas, Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento, Estiver, sentir, viver, for, Mais possuirei a existência total do universo, Mais completo serei pelo espaço inteiro fora.

O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que lêem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm.

Nas faldas do Himalaia, o Himalaia é só as faldas do Himalaia. É na distância ou na memória ou na imaginação que o Himalaia é da sua altura, ou talvez um pouco mais alto.

Tudo vale a pena,se a alma não é pequena.

Tenho em mim os maiores sonhos do mundo

Chove. que fiz eu da vida? Fiz o que ela fez de mim... De pensada , mal vivida ... Triste de quem é assim !

Segue o teu destino... Rega as tuas plantas; Ama as tuas rosas. O resto é a sombra de árvores alheias

Minha Pátria é minha língua. Pouco se me dá que Portugal seja invadido, desde que não mexam comigo

Bendito seja eu por tudo o que não sei gozo tudo isso como quem sabe que há o sol

Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque ama, nem sabe o que é amar...

Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.

Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena.

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o!

Dever de Sonhar Eu tenho uma espécie de dever, dever de sonhar, de sonhar sempre, pois sendo mais do que um espetáculo de mim mesmo, eu tenho que ter o melhor espetáculo que posso. E, assim, me construo a ouro e sedas, em salas supostas, invento palco, cenário para viver o meu sonho entre luzes brandas e músicas invisíveis.

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas ... Que já têm a forma do nosso corpo ... E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares ... É o tempo da travessia ... E se não ousarmos fazê-la ... Teremos ficado ... para sempre ... À margem de nós mesmos...

Nunca amamos alguém. Amamos, tão-somente, a idéia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é nós mesmos- que amamos. Isto é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso dado por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma idéia nossa.(...) As relações entre uma alma e outra, através de coisas tão incertas e divergentes como as palavras comuns e os gestos que se empreendem, são matéria de estranha complexidade. No próprio ato em que nos conhecemos, nos desconhecemos. Dizem os dois amo-te ou pensam-no e sentem-no por troca, e cada uma quer dizer uma idéia diferente, uma vida diferente, até, porventura, uma cor ou um aroma diferente, na soma abstracta de impressões que constiui a atividade da alma. (...)

... Nem tudo é dias de sol, E a chuva, quando falta muito, pede-se -Por isso tomo a infelicidade com a felicidade Naturalmente, como quem não estranha Que haja montanhas e planícies E quando haja rochedos e erva... O que é preciso é ser-se natural e calmo Na felicidade ou na infelicidade, Sentir como quem olha, Pensar como quem anda, E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre, E que o poente é belo e é bela a noite que fica... Assim é e assim seja...

Tenho tanto sentimento Tenho tanto sentimento Que é freqüente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Teus olhos entristecem. Teus olhos entristecem Nem ouves o que digo. Dormem, sonham esquecem... Não me ouves, e prossigo. Digo o que já, de triste, Te disse tanta vez... Creio que nunca o ouviste De tão tua que és. Olhas-me de repente De um distante impreciso Com um olhar ausente. Começas um sorriso. Continuo a falar. Continuas ouvindo O que estás a pensar, Já quase não sorrindo. Até que neste ocioso Sumir da tarde fútil, Se esfolha silencioso O teu sorriso inútil.

Liberdade Ai que prazer Não cumprir um dever, Ter um livro para ler E não o fazer! Ler é maçada, Estudar é nada. O sol doira Sem literatura. O rio corre, bem ou mal, Sem edição original. E a brisa, essa, De tão naturalmente matinal, Como tem tempo não tem pressa... Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto é melhor, quando há bruma, Esperar por D. Sebastião, Quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças, Flores, música, o luar, e o sol, que peca Só quando, em vez de criar, seca. O mais do que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças Nem consta que tivesse biblioteca...

A miséria do meu ser A miséria do meu ser, Do ser que tenho a viver, Tornou-se uma coisa vista. Sou nesta vida um qualquer Que roda fora da pista. Ninguém conhece quem sou Nem eu mesmo me conheço E, se me conheço, esqueço, Porque não vivo onde estou. Rodo, e o meu rodar apresso. É uma carreira invisível, Salvo onde caio e sou visto, Porque cair é sensível Pelo ruído imprevisto... Sou assim. Mas isto é crível?

O Amor O AMOR, quando se revela, Não se sabe revelar. Sabe bem olhar pra ela, Mas não lhe sabe falar. Quem quer dizer o que sente Não sabe o que há de dizer. Fala: parece que mente... Cala: parece esquecer... Ah, mas se ela adivinhasse, Se pudesse ouvir o olhar, E se um olhar lhe bastasse Pra saber que a estão a amar! Mas quem sente muito, cala; Quem quer dizer quanto sente Fica sem alma nem fala, Fica só, inteiramente! Mas se isto puder contar-lhe O que não lhe ouso contar, Já não terei que falar-lhe Porque lhe estou a falar...

Trago dentro do meu coração, Como num cofre que se não pode fechar de cheio, Todos os lugares onde estive, Todos os portos a que cheguei, Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias, Ou de tombadilhos, sonhando, E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que eu quero. Álvaro de Campos

Sentir tudo de todas as maneiras, Viver tudo de todos os lados, Ser a mesma coisa de todos os modos possíveis ao mesmo tempo, Realizar em si toda a humanidade de todos os momentos Num só momento difuso, profuso, completo e longínquo.

(Tenho tanto sentimento) Tenho tanto sentimento Que é freqüente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Amo como o amor ama. Não sei razão pra amar-te mais que amar-te. Que queres que te diga mais que te amo, Se o que quero dizer-te é que te amo? ..................................................................... Quando te falo, dói-me que respondas Ao que te digo e não ao meu amor. ..................................................................... Ah! não perguntes nada; antes me fala De tal maneira, que, se eu fora surda, Te ouvisse todo com o coração. Se te vejo não sei quem sou: eu amo. Se me faltas [...] ... Mas tu fazes, amor, por me faltares Mesmo estando comigo, pois perguntas — Quando é amar que deves. Se não amas, Mostra-te indiferente, ou não me queiras, Mas tu és como nunca ninguém foi, Pois procuras o amor pra não amar, E, se me buscas, é como se eu só fosse Alguém pra te falar de quem tu amas. ..................................................................... Quando te vi amei-te já muito antes: Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo. Não há cousa feliz ou hora alegre Que eu tenha tido pela vida fora, Que o não fosse porque te previa, Porque dormias nela tu futuro. ..................................................................... E eu soube-o só depois, quando te vi, E tive para mim melhor sentido, E o meu passado foi como uma strada Iluminada pela frente, quando O carro com lanternas vira a curva Do caminho e já a noite é toda humana. ..................................................................... Quando eu era pequena, sinto que eu Amava-te já longe, mas de longe... ..................................................................... Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta! — Compreendo-te tanto que não sinto, Oh coração exterior ao meu! Fatalidade, filha do destino E das leis que há no fundo deste mundo! Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto De o sentir...?

Sossega, coração! Não desesperes! Talvez um dia, para além dos dias, Encontres o que queres porque o queres. Então, livre de falsas nostalgias, Atingirás a perfeição de seres. Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo! Pobre esperença a de existir somente! Como quem passa a mão pelo cabelo E em si mesmo se sente diferente, Como faz mal ao sonho o concebê-lo! Sossega, coração, contudo! Dorme! O sossego não quer razão nem causa. Quer só a noite plácida e enorme, A grande, universal, solente pausa Antes que tudo em tudo se transforme.

Somos do tamanho de nossos sonhos

Eu sou do tamanho daquilo que vejo e não do da minha altura.

Eu sou do tamanho daquilo que vejo, e não do tamanho da minha altura...

Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque ama, nem o que é amar Amar é a eterna inocência, E a única inocência, não pensar...

... Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque* ama, nem o que é amar Amar é a eterna inocência, E a única inocência, não pensar...

Eu sei que não sou nada e que talvez nunca tenha tudo. Aparte isso, eu tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.

Não existem amores perfeitos, mas amantes acomodados.

Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão

Amei-te por te amar Amei-te e por te amar Só a ti eu não via... Eras o céu e o mar, Eras a noite e o dia... Só quando te perdi É que eu te conheci... Quando te tinha diante Do meu olhar submerso Não eras minha amante... Eras o Universo... Agora que te não tenho, És só do teu tamanho. Estavas-me longe na alma, Por isso eu não te via... Presença em mim tão calma, Que eu a não sentia. Só quando meu ser te perdeu Vi que não eras eu. Não sei o que eras. Creio Que o meu modo de olhar, Meu sentir meu anseio Meu jeito de pensar... Eras minha alma, fora Do Lugar e da Hora... Hoje eu busco-te e choro Por te poder achar Não sequer te memoro Como te tive a amar... Nem foste um sonho meu... Porque te choro eu? Não sei... Perdi-te, e és hoje Real no [...] real... Como a hora que foge, Foges e tudo é igual A si-próprio e é tão triste O que vejo que existe. Em que és [...] fictício, Em que tempo parado Foste o (...) cilício Que quando em fé fechado Não sentia e hoje sinto Que acordo e não me minto... [...] tuas mãos, contudo, Sinto nas minhas mãos, Nosso olhar fixo e mudo Quantos momentos vãos Pra além de nós viveu Nem nosso, teu ou meu... Quantas vezes sentimos Alma nosso contacto Quantas vezes seguimos Pelo caminho abstrato Que vai entre alma e alma... Horas de inquieta calma! E hoje pergunto em mim Quem foi que amei, beijei Com quem perdi o fim Aos sonhos que sonhei... Procuro-te e nem vejo O meu próprio desejo... Que foi real em nós? Que houve em nós de sonho? De que Nós fomos de que voz O duplo eco risonho Que unidade tivemos? O que foi que perdemos? Nós não sonhamos. Eras Real e eu era real. Tuas mãos - tão sinceras... Meu gesto - tão leal... Tu e eu lado a lado... Isto... e isto acabado... Como houve em nós amor E deixou de o haver? Sei que hoje é vaga dor O que era então prazer... Mas não sei que passou Por nós e acordou... Amamo-nos deveras? Amamo-nos ainda? Se penso vejo que eras A mesma que és... E finda Tudo o que foi o amor; Assim quase sem dor. Sem dor... Um pasmo vago De ter havido amar... Quase que me embriago De mal poder pensar... O que mudou e onde? O que é que em nós se esconde? Talvez sintas como eu E não saibas senti-o... Ser é ser nosso véu Amar é encobri-o, Hoje que te deixei É que sei que te amei... Somos a nossa bruma... É pra dentro que vemos... Caem-nos uma a uma As compreensões que temos E ficamos no frio Do Universo vazio... Que importa? Se o que foi Entre nós foi amor, Se por te amar me dói Já não te amar, e a dor Tem um íntimo sentido, Nada será perdido... E além de nós, no Agora Que não nos tem por véus Viveremos a Hora Virados para Deus E num (...) mudo Compreenderemos tudo.

As lentas nuvens fazem sono As lentas nuvens fazem sono, O céu azul faz bom dormir. Bóio, num íntimo abandono, À tona de me não sentir. E é suave, como um correr de água, O sentir que não sou alguém, Não sou capaz de peso ou mágoa. Minha alma é aquilo que não tem. Que bom, à margem do ribeiro Saber que é ele que vai indo... E só em sono eu vou primeiro. E só em sonho eu vou seguindo.

Uma névoa de Outono o ar raro vela, (5-11-1932) Uma névoa de Outono o ar raro vela, Cores de meia-cor pairam no céu. O que indistintamente se revela, Árvores, casas, montes, nada é meu. Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono. Sim, sinto-o eu pelo coração, o como. Mas entre mim e ver há um grande sono. De sentir é só a janela a que eu assomo. Amanhã, se estiver um dia igual, Mas se for outro, porque é amanhã, Terei outra verdade, universal, E será como esta [...]

Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar! Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu

Nunca amamos ninguém. Amamos, tão-somente, a idéia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos. Isso é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso, dado por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma idéia nossa.

A OUTRA Amamos sempre no que temos O que não temos quando amamos. O barco pára, largo os remos E, um a outro,as mãos nos damos. A quem dou as mãos? À Outra. Teus beijos são de mel de boca, São os que sempre pensei dar, E agora a minha boca toca A boca que eu sonhei beijar. De quem é a boca? Da Outra. O remos já caíram na água, O barco faz o que a água quer. Meus braços vingam minha mágoa No abraço quie enfim podem ter. Quem abraço? A Outra. Bem sei, és bela, és quem desejei.. Não deixe a vida que eu deseje Mais que o que pode ser teu beijo E poder ser eu que te beije. Beijo, e em quem penso? Na Outra. Os remos vão perdidos já, O barco vai e não sei para onde. Que fresco o teu sorriso está, Ah, meu amor, e o que ele esconde! Que é do sorriso Da Outra? Ah, talvez, mortos ambos nós, Num outro rio sem lugar Em outro barco outra vez sós Possamos nós recomeçar Que talvez sejas A Outra. Mas não, nem onde essa paisagem É sob eterna luz eterna Te acharei mais que alguém na viagem Que amei com ansiedade terna Por ser parecida Com a Outra. Ah, por ora, idos remos e rumo, Dá-me as mãos, a boca, o teu ser. E façamos desta hora um resumo Do que não poderemos ter. Nesta hora, a única Sê a Outra.

Tenho tanto sentimento Que é freqüente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Pouco importa de onde a brisa Traz o olor que nela vem. O coração não precisa De saber o que é o bem. A mim me basta nesta hora A melodia que embala. Que importa se, sedutora, As forças da alma cala? Quem sou, pra que o mundo perca Com o que penso a sonhar? Se a melodia me cerca Vivo só o me cercar...

Ao longe, ao luar Ao longe, ao luar, No rio uma vela, Serena a passar, Que é que me revela ? Não sei, mas meu ser Tornou-se-me estranho, E eu sonho sem ver Os sonhos que tenho. Que angústia me enlaça ? Que amor não se explica ? É a vela que passa Na noite que fica.

DEVE CHAMAR TRISTEZA Deve chamar-se tristeza Isto que não sei que seja Que me inquieta sem surpresa Saudade que não deseja. Sim, tristeza - mas aquela Que nasce de conhecer Que ao longe está uma estrela E ao perto está não a Ter. Seja o que for, é o que tenho. Tudo mais é tudo só. E eu deixo ir o pó que apanho De entre as mãos ricas de pó.

ENTRE SONO E SONHOS Entre mim e o que em mim É o quem eu me suponho Corre um rio sem fim. Passou por outras margens, Diversas mais além, Naquelas várias viagens Que todo o rio tem. Chegou onde hoje habito A casa que hoje sou. Passa, se eu me medito; Se desperto, passou. E quem me sinto e morre No que me liga a mim Dorme onde o rio corre — Esse rio sem fim.

POEMA EM LINHA RETA Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, Indesculpavelmente sujo, Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, Que tenho sofrido enxovalhos e calado, Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel, Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes, Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado Para fora da possibilidade do soco; Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas, Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo. Toda a gente que eu conheço e que fala comigo Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida... Quem me dera ouvir de alguém a voz humana Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? Ó príncipes, meus irmãos, Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo? Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca! E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído, Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? Eu, que venho sido vil, literalmente vil, Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

É fácil trocar as palavras, Difícil é interpretar os silêncios! É fácil caminhar lado a lado, Difícil é saber como se encontrar! É fácil beijar o rosto, Difícil é chegar ao coração! É fácil apertar as mãos, Difícil é reter o calor! É fácil sentir o amor, Difícil é conter sua torrente! Como é por dentro outra pessoa? Quem é que o saberá sonhar? A alma de outrem é outro universo Com que não há comunicação possível, Com que não há verdadeiro entendimento. Nada sabemos da alma Senão da nossa; As dos outros são olhares, São gestos, são palavras, Com a suposição De qualquer semelhança no fundo.

Sorriso audível das folhas, Não és mais que a brisa ali. Se eu te olho e tu me olhas, Quem primeiro é que sorri? O primeiro a sorrir ri. Ri, e olha de repente, Para fins de não olhar, Para onde nas folhas sente O som do vento passar. Tudo é vento e disfarçar. Mas o olhar, de estar olhando Onde não olha, voltou; E estamos os dois falando O que se não conversou. Isto acaba ou começou

Não sei quem sou, que alma tenho. Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo. Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros)... Sinto crenças que não tenho. Enlevam-me ânsias que repudio. A minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me ponta traições de alma a um carácter que talvez eu não tenha, nem ela julga que eu tenho. Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas. Como o panteísta se sente árvore (?) e até a flor, eu sinto-me vários seres. Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada (?), por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço.

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas ... Que já têm a forma do nosso corpo ... E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares ... É o tempo da travessia ... E se não ousarmos fazê-la ... Teremos ficado ... para sempre ... À margem de nós mesmos... Quanto a mim , estou com um guarda-roupa novo. E você ? se, já despiu-se da antiga roupa, pode vir, mesmo que estejas nú...!!!!!! TE AMO...TE AMO...TE AMO...TE AMO...TE AMO...!!!!!!!!! ( PP MLLM ) e sente

Não importa se a estação do ano muda... Se o século vira, se o milênio é outro. Se a idade aumenta... Conserva a vontade de viver, Não se chega a parte alguma sem ela.

Tenho pensamentos que, pudesse eu trazê-los à luz e dar-lhes vida, emprestariam nova leveza às estrelas, nova beleza ao mundo, e maior amor ao coração dos homens

Há duas formas para viver a sua vida: Uma é acreditar que não existe milagre. A outra é acreditar que todas as coisas são um milagre.

Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.

Não é o tédio a doença do aborrecimento de nada ter que fazer, mas a doença maior de se sentir que não vale a pena fazer nada.

Sábio é quem se contenta com o espetáculo do mundo.

Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés. O mesmo sempre, graças ao céu e à terra. E aos meus olhos e ouvidos atentos. E à minha clara simplicidade de alma...

Enquanto houver você do outro lado, eu consigo me orintar. By: Aninha-Diniz

A maioria pensa com a sensibilidade, eu sinto com o pensamento.....

Já não sei andar só pelos caminhos, Porque já não posso andar só.

Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras; Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento. Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

É talvez o último dia da minha vida. Saudei o Sol, levantando a mão direita, Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus, Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. Meninos carentes...!!!chantagens...!!!! brinquedos...!!! Dos Mimos que TE Dou... Só O Meu Imenso Amor...!!!!!!!

AMO-TE Amo-te quanto em largo, alto e profundo Minhalma alcança quando, transportada, sente, alongando os olhos deste mundo, os fins do ser, a graça entresonhada. Amo-te a cada dia, hora e segundo A luz do sol, na noite sossegada e é tão pura a paixão de que me inundo Quanto o pudor dos que não pedem nada. Amo-te com a dor, das velhas penas com sorrisos, com lágrimas de prece, e a fé de minha infancia, ingenua e forte. Amo-te até nas coisas mais pequenas, por toda vida, e assim DEUS o quiser Ainda mais te amarei depois da morte.

Sim, sei bem Que nunca serei alguém. Sei de sobra Que nunca terei uma obra. Sei, enfim, Que nunca saberei de mim. Sim, mas agora, Enquanto dura esta hora, Este luar, estes ramos, Esta paz em que estamos, Deixem-me crer O que nunca poderei ser.

Não tenho ambições nem desejos. ser poeta não é uma ambição minha. É a minha maneira de estar sózinho. ... Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz E corre um silêncio pela erva fora. ... Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque ama, nem sabe o que é amar... ... Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo... Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer, Porque eu sou do tamanho do que vejo E não do tamanho da minha altura... ... A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E olha devagar para elas.

A espantosa realidade das coisas é a minha descoberta de todos os dias. Cada coisa é o que é. E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, e quanto isso me basta. Basta existir para se ser completo.

Amei-te e por te amar Amei-te e por te amar Só a ti eu não via... Eras o céu e o mar, Eras a noite e o dia... Só quando te perdi É que eu te conheci... Quando te tinha diante Do meu olhar submerso Não eras minha amante... Eras o Universo... Agora que te não tenho, És só do teu tamanho. Estavas-me longe na alma, Por isso eu não te via... Presença em mim tão calma, Que eu a não sentia. Só quando meu ser te perdeu Vi que não eras eu. Não sei o que eras. Creio Que o meu modo de olhar, Meu sentir meu anseio Meu jeito de pensar... Eras minha alma, fora Do Lugar e da Hora... Hoje eu busco-te e choro Por te poder achar Não sequer te memoro Como te tive a amar... Nem foste um sonho meu... Porque te choro eu? Não sei... Perdi-te, e és hoje Real no [...] real... Como a hora que foge, Foges e tudo é igual A si-próprio e é tão triste O que vejo que existe. Em que és [...J fictício, Em que tempo parado Foste o (...) cilício Que quando em fé fechado Não sentia e hoje sinto Que acordo e não me minto... [...] tuas mãos, contudo, Sinto nas minhas mãos, Nosso olhar fixo e mudo Quantos momentos vãos Pra além de nós viveu Nem nosso, teu ou meu... Quantas vezes sentimos Alma nosso contacto Quantas vezes seguimos Pelo caminho abstracto Que vai entre alma e alma... Horas de inquieta calma! E hoje pergunto em mim Quem foi que amei, beijei Com quem perdi o fim Aos sonhos que sonhei... Procuro-te e nem vejo O meu próprio desejo... Que foi real em nós? Que houve em nós de sonho? De que Nós fomos de que voz O duplo eco risonho Que unidade tivemos? O que foi que perdemos? Nós não sonhámos. Eras Real e eu era real. Tuas mãos - tão sinceras... Meu gesto - tão leal... Tu e eu lado a lado... Isto... e isto acabado... Como houve em nós amor E deixou de o haver? Sei que hoje é vaga dor O que era então prazer... Mas não sei que passou Por nós e acordou... Amámo-nos deveras? Amamo-nos ainda? Se penso vejo que eras A mesma que és... E finda Tudo o que foi o amor; Assim quase sem dor. Sem dor... Um pasmo vago De ter havido amar... Quase que me embriago De mal poder pensar... O que mudou e onde? O que é que em nós se esconde? Talvez sintas como eu E não saibas sentil-o... Ser é ser nosso véu Amar é encobril-o, Hoje que te deixei É que sei que te amei... Somos a nossa bruma... É pra dentro que vemos... Caem-nos uma a uma As compreensões que temos E ficamos no frio Do Universo vazio... Que importa? Se o que foi Entre nós foi amor, Se por te amar me dói Já não te amar, e a dor Tem um íntimo sentido, Nada será perdido... E além de nós, no Agora Que não nos tem por véus Viveremos a Hora Virados para Deus E n´um(...) mudo Compreenderemos tudo.

A qualquer modo todo escuridão Eu sou supremo. Sou o Cristo negro. O que não crê, nem ama — o que só sabe O mistério tornado carne. Há um orgulho atro que me diz Que Sou Deus inconscienciando-me Para humano; sou mais real que o mundo, Por isso odeio-lhe a existência enorme, O seu amontoar de coisas vistas. Como um santo devoto Odeio o mundo, porque o que eu sou E que não sei sentir que sou, conhece-o Por não real e não ali. Por isso odeio-o — Seja eu o destruidor! Seja eu Deus ira!

Sou a Consciência em ódio ao inconsciente, Sou um símbolo incarnado em dor e ódio, Pedaço de alma de possível Deus Arremessado para o mundo Com a saudade pávida da pátria... Ó sistema mentido do universo, Estrelas nadas, sóis irreais, Oh, com que ódio carnal e estonteante Meu ser de desterrado vos odeia! Eu sou o inferno. Sou o Cristo negro, Pregado na cruz ígnea de mim mesmo. Sou o saber que ignora, Sou a insônia da dor e do pensar

Nunca amamos ninguém. Amamos, tão-somente, a idéia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos. Isso é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso dado por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma idéia nossa.

Se um homem escreve bem só quando está bêbado, dir-lhe-ei: embebede-se. E se ele me disser que o seu fígado sofre com isso respondo: o que é o seu fígado? É uma coisa morta que vive enquanto você vive, e os poemas que escrever vivem sem enquanto. Bernardo Soares

Eu, eu mesmo... Eu, cheio de todos os cansaços Quantos o mundo pode dar. – Eu... Afinal tudo, porque tudo é eu, E até as estrelas, ao que parece, Me saíram da algibeira para deslumbrar crianças... Que crianças não sei... Eu... Imperfeito? Incógnito? Divino? Não sei... Eu... Tive um passado? Sem dúvida... Tenho um presente? Sem dúvida... Terei um futuro? Sem dúvida... A vida que pare de aqui a pouco... Mas eu, eu... Eu sou eu, Eu fico eu, Eu...

Tenho tanto sentimento Que é freqüente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo... Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer.(...)

Saudades, só portugueses/ Conseguem senti-las bem/ Porque têm essa palavra/Para dizer que as têm.

Minha pátria é a língua portuguesa.

Não ser é outro ser.

Não sabemos da alma senão da nossa; As dos outros são olhares, são gestos, são palavras, com a suposição de qualquer semelhança no fundo.

Baste a quem baste o que lhe basta O bastante de lhe bastar! A vida é breve, a alma é vasta; Ter é tardar.

Sem a loucura que é o homem Mais que a besta sadia, Cadáver adiado que procria?

Tudo é incerto e derradeiro. Tudo é disperso, nada é inteiro

Estou só e sonho saudade. E como é branca de graça A paisagem que não sei, Vista de trás da vidraça Do lar que nunca terei!

Um cansaço de existir, De ser. Só de ser. O ser triste brilhar ou sorrir...

Livros são papéis pintados com tinta

Meu coração é um balde despejado. Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco A mim mesmo e não encontro nada

Eros e Psique ...E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades que vos foram dadas no Grau de Neófito, e aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade. (Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio Na Ordem Templária De Portugal) Conta a lenda que dormia Uma Princesa encantada A quem só despertaria Um Infante, que viria De além do muro da estrada. Ele tinha que, tentado, Vencer o mal e o bem, Antes que, já libertado, Deixasse o caminho errado Por o que à Princesa vem. A Princesa Adormecida, Se espera, dormindo espera, Sonha em morte a sua vida, E orna-lhe a fronte esquecida, Verde, uma grinalda de hera. Longe o Infante, esforçado, Sem saber que intuito tem, Rompe o caminho fadado, Ele dela é ignorado, Ela para ele é ninguém. Mas cada um cumpre o Destino Ela dormindo encantada, Ele buscando-a sem tino Pelo processo divino Que faz existir a estrada. E, se bem que seja obscuro Tudo pela estrada fora, E falso, ele vem seguro, E vencendo estrada e muro, Chega onde em sono ela mora, E, inda tonto do que houvera, À cabeça, em maresia, Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era A Princesa que dormia.

LIBERDADE Ai que prazer não cumprir um dever. Ter um livro para ler e não o fazer! Ler é maçada, estudar é nada. O sol doira sem literatura. O rio corre bem ou mal, sem edição original. E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal como tem tempo, não tem pressa... Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto melhor é quando há bruma. Esperar por D. Sebastião, Quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças, Flores, música, o luar, e o sol que peca Só quando, em vez de criar, seca. E mais do que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças, Nem consta que tivesse biblioteca...

PRECE Senhor, que és o céu e a terra, que és a vida e a morte! O sol és tu e a lua és tu e o vento és tu! Tu és os nossos corpos e as nossas almas e o nosso amor és tu também. Onde nada está tu habitas e onde tudo está - (o teu templo) - eis o teu corpo. Dá-me alma para te servir e alma para te amar. Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra, ouvidos para te ouvir no vento e no mar, e mãos para trabalhar em teu nome. Torna-me puro como a água e alto como o céu. Que não haja lama nas estradas dos meus pensamentos nem folhas mortas nas lagoas dos meus propósitos. Faze com que eu saiba amar os outros como irmãos e servir-te como a um pai. [...] Minha vida seja digna da tua presença. Meu corpo seja digno da terra, tua cama. Minha alma possa aparecer diante de ti como um filho que volta ao lar. Torna-me grande como o Sol, para que eu te possa adorar em mim; e torna-me puro como a lua, para que eu te possa rezar em mim; e torna-me claro como o dia para que eu te possa ver sempre em mim e rezar-te e adorar-te. Senhor, protege-me e ampara-me. Dá-me que eu me sinta teu. Senhor, livra-me de mim.

[...]perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder: É hora de se embriagar! Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha...

Como é por dentro outra pessoaQuem é que o saberá sonhar?A alma de outrem é outro universoCom que não há comunicação possível,Com que não há verdadeiro entendimento. Nada sabemos da almaSenão da nossa;As dos outros são olhares,São gestos, são palavras,Com a suposição de qualquer semelhançaNo fundo.

I/ ABISMO OLHO O TEJO, e de tal arte Que me esquece olhar olhando, E súbito isto me bate De encontro ao devaneando - O que é ser-rio, e correr? O que é está-lo eu a ver? Sinto de repente pouco, Vácuo, o momento, o lugar. Tudo de repente é oco - Mesmo o meu estar a pensar. Tudo - eu e o mundo em redor - Fica mais que exterior. Perde tudo o ser, ficar, E do pensar se me some. Fico sem poder ligar Ser, idéia, alma de nome A mim, à terra e aos céus... E súbito encontro Deus. II/ PASSOU Passou, fora de Quando, De Porquê, e de Passando..., Turbilhão de Ignorado, Sem ter turbilhonado..., Vasto por fora do Vasto Sem ser, que a si se assombra... O Universo é o seu rasto... Deus é a sua sombra... III/ A VOZ DE DEUS Brilha uma voz na noute... De dentro de Fora ouvi-a... Ó Universo, eu sou-te... Oh, o horror da alegria Deste pavor, do archote Se apagar, que me guia! Cinzas de idéia e de nome Em mim, e a voz: Ó mundo, Sermente em ti eu sou-me... Mero eco de mim, me inundo De ondas de negro lume Em que para Deus me afundo. IV/ A QUEDA Da minha idéia do mundo Caí... Vácuo além de profundo, Sem ter Eu nem Ali... Vácuo sem si-próprio, caos De ser pensado como ser... Escada absoluta sem degraus... Visão que se não pode ver... Além-Deus! Além-Deus! Negra calma... Clarão de Desconhecido... Tudo tem outro sentido, ó alma, Mesmo o ter-um-sentido... V/ BRAÇO SEM CORPO BRANDINDO UM GLÁDIO ( Entre a árvore e o vê-la ) Entre a árvore e o vê-la Onde está o sonho? Que arco da ponte mais vela Deus?... E eu fico tristonho Por não saber se a curva da ponte É a curva do horizonte... Entre o que vive e a vida Pra que lado corre o rio? Árvore de folhas vestida - Entre isso e Árvore há fio? Pombas voando - o pombal Está-lhes sempre à direita, ou é real? Deus é um grande Intervalo, Mas entre quê e quê?... Entre o que digo e o que calo Existo? Quem é que me vê? Erro-me... E o pombal elevado Está em torno na pomba, ou de lado? [1913?]

A Ciência A CIÊNCIA, a ciência, a ciência... Ah, como tudo é nulo e vão! A pobreza da inteligência Ante a riqueza da emoção! Aquela mulher que trabalha Como uma santa em sacrifício, Com tanto esforço dado a ralha! Contra o pensar, que é o meu vício! A ciência! Como é pobre e nada! Rico é o que alma dá e tem.

Aconteceu-me do Alto do Infinito Aconteceu-me do alto do infinito Esta vida. Através de nevoeiros, Do meu próprio ermo ser fumos primeiros, Vim ganhando, e través estranhos ritos De sombra e luz ocasional, e gritos Vagos ao longe, e assomos passageiros De saudade incógnita, luzeiros De divino, este ser fosco e proscrito... Caiu chuva em passados que fui eu. Houve planícies de céu baixo e neve Nalguma cousa de alma do que é meu. Narrei-me à sombra e não me achei sentido. Hoje sei-me o deserto onde Deus teve Outrora a sua capital de olvido...

A Criança Que Ri na Rua A CRIANÇA que ri na rua, A música que vem no acaso, A tela absurda, a estátua nua, A bondade que não tem prazo - Tudo isso excede este rigor Que o raciocínio dá a tudo, E tem qualquer cousa de amor, Ainda que o amor seja mudo

Adagas Cujas Jóias Velhas Galas Adagas cujas jóias velhas galas... Opalesci amar-me entre mãos raras, E fluido a febres entre um lembrar de aras, O convés sem ninguém cheio de malas... O íntimo silêncio das opalas Conduz orientes até jóias caras, E o meu anseio vai nas rotas claras De um grande sonho cheio de ócio e salas... Passa o cortejo imperial, e ao longe O povo só pelo cessar das lanças Sabe que passa o seu tirano, e estruge Sua ovação, e erguem as crianças Mas o teclado as tuas mãos pararam E indefinidamente repousaram...

A Estrada, Como Uma Senhora A ESTRADA, como uma senhora, Só dá passagem legalmente. Escrevo ao sabor quente da hora Baldadamente. Não saber bem o que se diz É um pouco sol e um pouco alma. Ah, quem me dera ser feliz Teria isto, mais a calma. Bom campo, estrada com cadastro, Legislação entre erva nata. Vou atar a lama com um nastro Só para ver quem ma desata.

I - Primeira Parte: Brasão Bellum sine bello. I. OS CAMPOS PRIMEIRO / O DOS CASTELOS A Europa jaz, posta nos cotovelos: De Oriente a Ocidente jaz, fitando, E toldam-lhe românticos cabelos Olhos gregos, lembrando. O cotovelo esquerdo é recuado; O direito é em ângulo disposto. Aquele diz Itália onde é pousado; Este diz Inglaterra onde, afastado, A mão sustenta, em que se apoia o rosto. Fita, com olhar sphyngico e fatal, O Ocidente, futuro do passado. O rosto com que fita é Portugal. SEGUNDO / O DAS QUINAS Os Deuses vendem quando dão. Comprase a glória com desgraça. Ai dos felizes, porque são Só o que passa! Baste a quem baste o que Ihe basta O bastante de Ihe bastar! A vida é breve, a alma é vasta: Ter é tardar. Foi com desgraça e com vileza Que Deus ao Cristo definiu: Assim o opôs à Natureza E Filho o ungiu. II. OS CASTELOS PRIMEIRO / ULISSES O mytho é o nada que é tudo. O mesmo sol que abre os céus É um mytho brilhante e mudo —- O corpo morto de Deus, Vivo e desnudo. Este, que aqui aportou, Foi por não ser existindo. Sem existir nos bastou. Por não ter vindo foi vindo E nos criou. Assim a lenda se escorre A entrar na realidade, E a fecundá-la decorre. Em baixo, a vida, metade De nada, morre. SEGUNDO / VIRIATO Se a alma que sente e faz conhece Só porque lembra o que esqueceu, Vivemos, raça, porque houvesse Memória em nós do instinto teu. Nação porque reencarnaste, Povo porque ressuscitou Ou tu, ou o de que eras a haste — Assim se Portugal formou. Teu ser é como aquela fria Luz que precede a madrugada, E é ja o ir a haver o dia Na antemanhã, confuso nada. TERCEIRO / O CONDE D. HENRIOUE Todo começo é involuntáario. Deus é o agente. O herói a si assiste, vário E inconsciente. À espada em tuas mãos achada Teu olhar desce. «Que farei eu com esta espada?» Ergueste-a, e fez-se. QUARTO / D. TAREJA As naçôes todas são mystérios. Cada uma é todo o mundo a sós. Ó mãe de reis e avó de impérios, Vela por nós! Teu seio augusto amamentou Com bruta e natural certeza O que, imprevisto, Deus fadou. Por ele reza! Dê tua prece outro destino A quem fadou o instinto teu! O homem que foi o teu menino Envelheceu. Mas todo vivo é eterno infante Onde estás e não há o dia. No antigo seio, vigilante, De novo o cria! QUINTO / D. AFONSO HENRIQUES Pai, foste cavaleiro. Hoje a vigília é nossa. Dá-nos o exemplo inteiro E a tua inteira força! Dá, contra a hora em que, errada, Novos infiéis vençam, A bênção como espada, A espada como benção! SEXTO / D. DINIS Na noite escreve um seu Cantar de Amigo O plantador de naus a haver, E ouve um silêncio múrmuro consigo: É o rumor dos pinhais que, como um trigo De Império, ondulam sem se poder ver. Arroio, esse cantar, jovem e puro, Busca o oceano por achar; E a fala dos pinhais, marulho obscuro, É o som presente desse mar futuro, É a voz da terra ansiando pelo mar. SÉTIMO (I) / D. JOÃO O PRIMEIRO O homem e a hora são um só Quando Deus faz e a história é feita. O mais é carne, cujo pó A terra espreita. Mestre, sem o saber, do Templo Que Portugal foi feito ser, Que houveste a glória e deste o exemplo De o defender. Teu nome, eleito em sua fama, É, na ara da nossa alma interna, A que repele, eterna chama, A sombra eterna. SÉTIMO (II) / D. FILIPA DE LENCASTRE Que enigma havia em teu seio Que só gênios concebia? Que arcanjo teus sonhos veio Velar, maternos, um dia? Volve a nós teu rosto sério, Princesa do Santo Graal, Humano ventre do Império, Madrinha de Portugal! III. AS QUINAS PRIMEIRA / D. DUARTE, REI DE PORTUGAL Meu dever fez-me, como Deus ao mundo. A regra de ser Rei almou meu ser, Em dia e letra escrupuloso e fundo. Firme em minha tristeza, tal vivi. Cumpri contra o Destino o meu dever. Inutilmente? Não, porque o cumpri. SEGUNDA / D. FERNANDO, INFANTE DE PORTUGAL Deu-me Deus o seu gládio, porque eu faça A sua santa guerra. Sagrou-me seu em honra e em desgraça, Às horas em que um frio vento passa Por sobre a fria terra. Pôs-me as mãos sobre os ombros e doirou-me A fronte com o olhar; E esta febre de Além, que me consome, E este querer grandeza são seu nome Dentro em mim a vibrar. E eu vou, e a luz do gládio erguido dá Em minha face calma. Cheio de Deus, não temo o que virá, Pois venha o que vier, nunca será Maior do que a minha alma. TERCEIRA / D. PEDRO, REGENTE DE PORTUGAL Claro em pensar, e claro no sentir, É claro no querer; Indiferente ao que há em conseguir Que seja só obter; Dúplice dono, sem me dividir, De dever e de ser — Não me podia a Sorte dar guarida Por não ser eu dos seus. Assim vivi, assim morri, a vida, Calmo sob mudos céus, Fiel à palavra dada e à idéia tida. Tudo o mais é com Deus! QUARTA / D. JOÃO, INFANTE DE PORTUGAL Não fui alguém. Minha alma estava estreita Entre tão grandes almas minhas pares, Inutilmente eleita, Virgemmente parada; Porque é do português, pai de amplos mares, Querer, poder só isto: O inteiro mar, ou a orla vã desfeita — O todo, ou o seu nada. QUINTA / D. SEBASTIÃO, REI DE PORTUGAL Louco, sim, louco, porque quis grandeza Qual a Sorte a não dá. Não coube em mim minha certeza; Por isso onde o areal está Ficou meu ser que houve, não o que há. Minha loucura, outros que me a tomem Com o que nela ia. Sem a loucura que é o homem Mais que a besta sadia, Cadáver adiado que procria? IV. A COROA NUNÁLVARES PEREIRA Que auréola te cerca? É a espada que, volteando. Faz que o ar alto perca Seu azul negro e brando. Mas que espada é que, erguida, Faz esse halo no céu? É Excalibur, a ungida, Que o Rei Artur te deu. Sperança consumada, S. Portugal em ser, Ergue a luz da tua espada Para a estrada se ver! V. O TIMBRE A CABEÇA DO GRIFO / O INFANTE D. HENRIOUE Em seu trono entre o brilho das esferas, Com seu manto de noite e solidão, Tem aos pés o mar novo e as mortas eras — O único imperador que tem, deveras, O globo mundo em sua mão. UMA ASA DO GRIFO / D. JOÃO O SEGUNDO Braços cruzados, fita além do mar. Parece em promontório uma alta serra — O limite da terra a dominar O mar que possa haver além da terra. Seu formidavel vulto solitário Enche de estar presente o mar e o céu E parece temer o mundo vário Que ele abra os braços e lhe rasgue o véu. A OUTRA ASA DO GRIFO / AFONSO DE ALBUQUEROUE De pé, sobre os países conquistados Desce os olhos cansados De ver o mundo e a injustiça e a sorte. Não pensa em vida ou morte Tão poderoso que não quer o quanto Pode, que o querer tanto Calcara mais do que o submisso mundo Sob o seu passo fundo. Três impérios do chão lhe a Sorte apanha. Criou-os como quem desdenha.

A Falência do Prazer e do Amor Terceiro Tema I Beber a vida num trago, e nesse trago Todas as sensações que a vida dá Em todas as suas formas [...] ..................................................................... Dantes eu queria Embeber-me nas árvores, nas flores, Sonhar nas rochas, mares, solidões. Hoje não, fujo dessa idéia louca: Tudo o que me aproxima do mistério Confrange-me de horror. Quero hoje apenas Sensações, muitas, muitas sensações, De tudo, de todos neste mundo — humanas, Não outras de delírios panteístas Mas sim perpétuos choques de prazer Mudando sempre, Guardando forte a personalidade Para sintetizá-las num sentir. Quero Afogar em bulício, em luz, em vozes, — Tumultuárias [cousas] usuais — o sentimento da desolação Que me enche e me avassala. Folgaria De encher num dia, [...] num trago, A medida dos vícios, inda mesmo Que fosse condenado eternamente — Loucura! — ao tal inferno, A um inferno real. II Alegres camponeses, raparigas alegres e ditosas, Como me amarga nalma essa alegria! ..................................................................... Nem em criança, ser predestinado, Alegre eu era assim; no meu brincar, Nas minhas ilusões da infância, eu punha O mal da minha predestinação. ..................................................................... Acabemos com esta vida assim! Acabemos! o modo pouco importa! Sofrer mais já não posso. Pois verei — Eu, Fausto — aqueles que não sentem bem Toda a extensão da felicidade, Gozá-la? ..................................................................... Ferve a revolta em mim Contra a causa da vida que me fez Qual sou. E morrerei e deixarei Neste inundo isto apenas: uma vida Só prazer e só gozo, só amor, Só inconsciência em estéril pensamento E desprezo [...] Mas eu como entrarei naquela vida? Eu não nasci para ela. III Melodia vaga Para ti se eleva E, chorando, leva O teu coração, Já de dor exausto, E sonhando o afaga. Os teus olhos, Fausto, Não mais chorarão. IV Já não tenho alma. Dei-a à luz e ao ruído, Só sinto um vácuo imenso onde alma tive... Sou qualquer cousa de exterior apenas, Consciente apenas de já nada ser... Pertenço à estúrdia e à crápula da noite Sou só delas, encontro-me disperso Por cada grito bêbedo, por cada Tom da luz no amplo bojo das botelhas. Participo da névoa luminosa Da orgia e da mentira do prazer. E uma febre e um vácuo que há em mim Confessa-me já morto... Palpo, em torno Da minha alma, os fragmentos do meu ser Com o hábito imortal de perscrutar-me. V Perdido No labirinto de mim mesmo, já Não sei qual o caminho que me leva Dele à realidade humana e clara Cheia de luz [...] alegremente Mas com profunda pesadez em mim Esta alegria, esta felicidade, Que odeio e que me fere [...] ..................................................................... Sinto como um insulto esta alegria — Toda a alegria. Quase que sinto Que rir, é rir — não de mim, mas, talvez, Do meu ser. VI Toda a alegria me gela, me faz ódio. Toda a tristeza alheia me aborrece, Absorto eu na minha, maior muito Que outras [...] ..................................................................... Sinto em mim que a minha alma não tolera Que seja alguém do que ela mais feliz; O riso insulta-me, por existir; Que eu sinto que não quero que alguém ria Enquanto eu não puder. Se acaso tento Sentir, querer, só quero incoerências De indefinida aspiração imensa, Que mesmo no seu sonho é desmedida ... VII tua inconsciência alegre é uma ofensa para mim. O seu riso esbofeteia-me! Tua alegria cospe-me na cara! Oh, com que ódio carnal e espiritual escarro sobre o que na alma humana Fria festas e danças e cantigas... .................................................................... Com que alegria minha, cairia Um raio entre eles! Com que pronto Criaria torturas para eles Só por rirem a vida em minha cara E atirarem à minha face pálida O seu gozo em viver, a poeira — que arda Em meus olhos — dos seus momentos ocos De infância adulta e tudo na alegria! ..................................................................... Ó ódio, alegra-me tu sequer! Faze-me ver a Morte. roendo a todos, Põe-me ria vista os vermes trabalhando Aqueles corpos! [...] VIII Triste horror dalma, não evoco já Com grata saudade, tristemente, Estas recordações da juventude! Já não sinto saudades, como há pouco Inda as sentia. Vai-se-me embotando, Coa força de pensar, contínuo e árido, Toda a verdura e flor do pensamento. Ao recordar agora, apenas sinto, Como um cansaço só de ter vivido, Desconsolado e mudo sentimento De ter deixado atrás parte de mim, E saudade de não ter saudade, Saudades dos tempos em que as tinha. Se a minha infância agora evoco, vejo — Estranho! — como uma outra criatura Que me era amiga, numa vaga Objetivada subjetividade. Ora a infância me lembra, como um sonho, Ora a uma distância sem medida No tempo, desfazendo-me em espanto; E a sensação que sinto, ao perceber Que vou passando, já tem mais de horror Que tristeza [...] E nada evoca, a não ser o mistério Que o tempo tem fechado em sua mão. Mas a dor é maior! IX Ó vestidas razões! Dor que é vergonha E por vergonha de si-própria cala A si-mesma o seu nexo! Ó vil e baixa Porca animalidade do animal, Que se diz metafísica por medo A saber-se só baixa ... ..................................................................... Ó horror metafísico de ti! Sentido pelo instinto, não na mente! Vil metafísica do horror da carne, Medo do amor... Entre o teu corpo e o meu desejo dele Stá o abismo de seres consciente; Pudesse-te eu amar sem que existisses E possuir-te sem que ali estivesses! Ah, que hábito recluso de pensar Tão desterra o animal que ousar não ouso O que a [besta mais vil] do mundo vil Obra por maquinismo. Tanto fechei à chave, aos olhos de outros, Quanto em mim é instinto, que não sei Com que gestos ou modos revelar Um só instinto meu a olhos que olhem ... ..................................................................... Deus pessoal, deus gente, dos que crêem, Existe, para que eu te possa odiar! Quero alguém a quem possa a maldição Lançar da minha vida que morri, E não o vácuo só da noite muda Que me não ouve. X O horror metafísico de Outrem! O pavor de uma consciência alheia Como um deus a espreitar-me! Quem me dera Ser a única [cousa ou] animal Para não ter olhares sobre mim! XI Um corpo humano! Às vezes eu, olhando o próprio corpo, Estremecia de terror ao vê-lo Assim na realidade, tão carnal. XII ................................................. Sinto horror À significação que olhos humanos Contém... ..................................................................... Sinto preciso Ocultar o meu íntimo aos olhares E aos perscrutamentos que olhares mostram; Não quero que ninguém saiba o que sinto, Além de que o não posso a alguém dizer... XIII Com que gesto de alma Dou o passo de mim até à posse Do corpo de outros, horrorosamente Vivo, consciente, atento a mim, tão ele Como eu sou eu. XIV Não me concebo amando, nem dizendo A alguém eu te amo — sem que me conceba Com uma outra alma que não é a minha Toda a expansão e transfusão de vida Me horroriza, como a avaro a idéia De gastar e gastar inutilmente — Inda que no gastar se [extraia] gozo. XV Quando se adoram, vividos, Dois seres juvenis e naturais Parece que harmonias se derramam Como perfumes pela terra em flor. Mas eu, ao conceber-me amando, sinto Como que um gargalhar hórrido e fundo Da existência em mim, como ridículo E desusado no que é natural. Nunca, senão pensando no amor, Me sinto tão longínquo e deslocado, Tão cheio de ódios contra o meu destino. — De raivas contra a essência do viver. XVI Vendo passar amantes Nem propriamente inveja ou ódio sinto, Mas um rancor e uma aversão imensos Ao universo inteiro, por cobri-los. XVII O amor causa-me horror; é abandono, Intimidade... ... Não sei ser inconsciente E tenho para tudo [...] A consciência, o pensamento aberto Tornando-o impossível. E eu tenho do alto orgulho a timidez E sinto horror a abrir o ser a alguém, A confiar n’alguém. Horror eu sinto A que perscrute alguém, ou levemente Ou não, quaisquer recantos do meu ser. Abandonar-me em braços nus e belos (Inda que deles o amor viesse) No conceber do todo me horroriza; Seria violar meu ser profundo, Aproximar-me muito de outros homens. Uma nudez qualquer — espírito ou corpo — Horroriza-me: acostumei-me cedo Nos despimentos do meu ser A fixar olhos pudicos, conscientes. Do mais. Pensar em dizer amo-te E amo-te só — só isto, me angustia... XVIII [...] eu mesmo Sinto esse frio coração em mim Admirado de ser um coração Tão frio está. XIX Seria doce amar, cingir a mim Um corpo de mulher, mais frio e grave e feito em tudo, transcendentalmente O pensamento agrada-me, e confrange-me Do terror de perto, e [junto] Em sensação ao meu, um outro corpo. Gelada mão misteriosa cai Sobre a imaginação [...] XX É isto o amor? Só isto? [...] ..................................................................... Sinto ânsias, desejos, Mas não com meu ser todo. Alguma cousa No íntimo meu, alguma cousa ali — Fria, pesada, muda — permanece. [Pra] isto deixei eu a vida antiga Que já bem não concebo, parecendo Vaga já. Já não sinto a agonia muda e funda Mas uma, menos funda e dolorosa, [Bem] mais terrível raiva [...] De movimentos íntimos, desejos Que são como rancores. Um cansaço violento e desmedido De existir e sentir-me aqui, e um ódio Nascido disto, vago e horroroso, A tudo e todos... XXI — Amo como o amor ama. Não sei razão pra amar-te mais que amar-te. Que queres que te diga mais que te amo, Se o que quero dizer-te é que te amo? ..................................................................... Quando te falo, dói-me que respondas Ao que te digo e não ao meu amor. ..................................................................... Ah! não perguntes nada; antes me fala De tal maneira, que, se eu fora surda, Te ouvisse todo com o coração. Se te vejo não sei quem sou: eu amo. Se me faltas [...] ... Mas tu fazes, amor, por me faltares Mesmo estando comigo, pois perguntas — Quando é amar que deves. Se não amas, Mostra-te indiferente, ou não me queiras, Mas tu és como nunca ninguém foi, Pois procuras o amor pra não amar, E, se me buscas, é como se eu só fosse Alguém pra te falar de quem tu amas. ..................................................................... Quando te vi amei-te já muito antes: Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo. Não há cousa feliz ou hora alegre Que eu tenha tido pela vida fora, Que o não fosse porque te previa, Porque dormias nela tu futuro. ..................................................................... E eu soube-o só depois, quando te vi, E tive para mim melhor sentido, E o meu passado foi como uma strada Iluminada pela frente, quando O carro com lanternas vira a curva Do caminho e já a noite é toda humana. ..................................................................... Quando eu era pequena, sinto que eu Amava-te já longe, mas de longe... ..................................................................... Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta! — Compreendo-te tanto que não sinto, Oh coração exterior ao meu! Fatalidade, filha do destino E das leis que há no fundo deste mundo! Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto De o sentir...? ..................................................................... XXII Pra que te falar? Ninguém me irmana Os pensamentos na compreensão. Sou só por ser supremo, e tudo em mim É maior. XXIII Reza por mim! A mais não me enterneço. Só por mim mesmo sei enternecer-me, Soba a ilusão de amar e de sentir em que forçadamente me detive. Reza por mim, por mim! Eis a que chega A minha tentativa [em] querer amar.

Que fiz de mim? Encontrei-me Quando estava já perdido, Impaciente deixei-me Como a um louco que teime No que lhe foi desmentido

Dorme sobre meu seio, Sem mágoa nem amor... No teu olhar eu leio O íntimo torpor De quem conhece o nada-ser De vida e gozo e dor.

Quando é que eu serei da tua cor, Do teu plácido e azul encanto, Ó claro dia exterior, Ó céu mais útil que o meu pranto?

Se perder um amor... não se perca! Se o achar... segure-o! Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. O mais... é nada.

Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser um.

Amar é cansar-se de estar só...

Nasci sujeito como os outros a erros e a defeitos, Mas nunca ao erro de querer compreender só com a inteligência, Nunca ao defeito de exigir do Mundo Que fosse qualquer cousa que não fosse o Mundo.

Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.

Quanto mais diferente de mim alguém é, mais real me parece, porque menos depende da minha subjetividade.

Se depois de eu morrer. quizerem escrever a minha biografia, não há nada mais simples.Tenho só duas datas : a de minha nascença e a de minha morte. Entre uma e outra todos os dias são meus.......

Sentir é estar dístraido.

Quando o amor não tem razão É que o amor incomoda.

Quanto amei ou deixei de amar, é a mesma saudade em mim.

O que me doí não é O que há no coração Mas essas coisas lindas Que nunca existirão...

Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto {…} De resto, com que posso contar comigo? Uma acuidade horrível das sensações, e a compreensão profunda de estar sentindo…Uma inteligência aguda para me destruir, e um poder de sonho sôfrego de me entreter…”

Horizonte O mar anterior a nós, teus medos Tinham coral e praias e arvoredos. Desvendadas a noite e a cerração, As tormentas passadas e o mistério, Abria em flor o Longe, e o Sul sidério Splendia sobre sobre as naus da iniciação. Linha severa da longínqua costa Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta Em árvores onde o Longe nada tinha; Mais perto, abre-se a terra em sons e cores: E, no desembarcar, há aves, flores, Onde era só, de longe a abstracta linha. O sonho é ver as formas invisíveis Da distância imprecisa, e, com sensíveis Movimentos da esprança e da vontade, Buscar na linha fria do horizonte A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte Os beijos merecidos da Verdade.

Já não me importo Já não me importo Até com o que amo ou creio amar. Sou um navio que chegou a um porto E cujo movimento é ali estar. Nada me resta Do que quis ou achei. Cheguei da festa Como fui para lá ou ainda irei Indiferente A quem sou ou suponho que mal sou, Fito a gente Que me rodeia e sempre rodeou, Com um olhar Que, sem o poder ver, Sei que é sem ar De olhar a valer. E só me não cansa O que a brisa me traz De súbita mudança No que nada me faz.

Qualquer coisa de obscuro permanece No centro do meu ser. Se me conheço, É até onde, por fim mal, tropeço No que de mim em mim de si se esquece. Aranha absurda que uma teia tece Feita de solidão e de começo Fruste, meu ser anónimo confesso Próprio e em mim mesmo a externa treva desce. Mas, vinda dos vestígios da distância Ninguém trouxe ao meu pálio por ter gente Sob ele, um rasgo de saudade ou ânsia. Remiu-se o pecador impenitente À sombra e cisma. Teve a eterna infância, Em que comigo forma um mesmo ente.

Quando estou só reconheço Quando estou só reconheço Se por momentos me esqueço Que existo entre outros que são Como eu sós, salvo que estão Alheados desde o começo. E se sinto quanto estou Verdadeiramente só, Sinto-me livre mas triste. Vou livre para onde vou, Mas onde vou nada existe. Creio contudo que a vida Devidamente entendida É toda assim, toda assim. Por isso passo por mim Como por cousa esquecida.

Contemplo o lago mudo que a brisa estremece Não sei se penso em tudo ou se o tudo me esquece O lago nada me diz, não sinto a brisa mexe-lo Não sei se sou feliz nem se desejo se-lo Tremulos rincos risonhos na agua adormecida porque fiz eu dos sonhos a minha única vida?

Pensar em Deus é desobedecer a Deus, Porque Deus quis que o não conhecêssemos, Por isso se nos não mostrou... Sejamos simples e calmos, Como os regatos e as árvores, E Deus amar-nos-á fazendo de nós Belos como as árvores e os regatos, E dar-nos-á verdor na sua primavera, E um rio aonde ir ter quando acabemos!...

Que auréola te cerca? É a espada que, volteando. Faz que o ar alto perca Seu azul negro e brando. Mas que espada é que, erguida, Faz esse halo no céu? É Excalibur, a ungida, Que o Rei Artur te deu. Sperança consumada, S. Portugal em ser, Ergue a luz da tua espada Para a estrada se ver!

Eros e Psique Conta a lenda que dormia Uma Princesa encantada A quem só despertaria Um Infante, que viria De além do muro da estrada. Ele tinha que, tentado, Vencer o mal e o bem, Antes que, já libertado, Deixasse o caminho errado Por o que à Princesa vem. A Princesa adormecida, Se espera, dormindo espera, Sonha em morte a sua vida, E orna-lhe a fronte esquecida, Verde, uma grinalda de hera. Longe o Infante, esforçado, Sem saber que intuito tem, Rompe o caminho fadado, Ele dela é ignorado, Ela para ele é ninguém. Mas cada um cumpre o destino Ela dormindo encantada, Ele buscando-a sem tino Pelo processo divino Que faz existir a estrada. E, se bem que seja obscuro Tudo pela estrada fora, E falso, ele vem seguro, E vencendo estrada e muro, Chega onde em sono ela mora, E, inda tonto do que houvera, À cabeça, em maresia, Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era A Princesa que dormia.

A Lua (dizem os ingleses), É feita de queijo verde. Por mais que pense mil vezes Sempre uma idéia se perde. E era essa, era, era essa, Que haveria de salvar Minha alma da dor da pressa De... não sei se é desejar. Sim, todos os meus desejos São de estar sentir pensando... A Lua (dizem os ingleses) É azul de quando em quando.

Como nuvens pelo céu Passam os sonhos por mim. Nenhum dos sonhos é meu Embora eu os sonhe assim. São coisas no alto que são Enquanto a vista as conhece, Depois são sombras que vão Pelo campo que arrefece. Símbolos? Sonhos? Quem torna Meu coração ao que foi? Que dor de mim me transtorna? Que coisa inútil me dói?

Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. O mais é nada.

A aranha da minha sorte Faz teia de muro a muro... Sou presa do meu suporte.

Só eu, de qualquer modo, não sou o mesmo, e isto é o mesmo também afinal.

Basta existir para se ser completo.

Nunca tive dinheiro para poder ter tédio à vontade .

Duvido, portanto penso.

Os meus pensamentos são contentes. Só tenho pena de saber que eles são contentes, Porque, se o não soubesse, Em vez de serem contentes e tristes, Seriam alegres e contentes

Todas as cartas de amor são ridículas, não seriam cartas de amor se não fossem ridículas.

Não sou da altura que me vêem, mas sim da altura que meus olhos podem ver.

O esforço é grande e o homem é pequeno .

Entre a árvore e o vê-la Onde está o sonho? Que arco da ponte mais vela Deus?... E eu fico tristonho Por não saber se a curva da ponte É a curva do horizonte... Entre o que vive e a vida Pra que lado corre o rio? Árvore de folhas vestida - Entre isso e Árvore há fio? Pombas voando - o pombal Está-lhes sempre à direita, ou é real? Deus é um grande Intervalo, Mas entre quê e quê?... Entre o que digo e o que calo Existo? Quem é que me vê? Erro-me... E o pombal elevado Está em torno na pomba, ou de lado?

Acho tão natural que não se pense Que me ponho a rir às vezes, sozinho, Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa Que tem que ver com haver gente que pensa... Que pensará o meu muro da minha sombra? Pergunto-me às vezes isto até dar por mim A perguntar-me cousas... E então desagrado-me, e incomodo-me Como se desse por mim com um pé dormente... Que pensará isto de aquilo? Nada pensa nada. Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem? Se ela a tiver, que a tenha... Que me importa isso a mim? Se eu pensasse nessas cousas, Deixaria de ver as árvores e as plantas E deixava de ver a Terra, Para ver só os meus pensamentos... Entristecia e ficava às escuras. E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu. (Acho tão Natural que não se Pense)

Minha dor é velha Como um frasco de essência cheio de pó. Minha dor é inútil Como uma gaiola numa terra onde não há aves, E minha dor é silenciosa e triste Como a parte da praia onde o mar não chega. Chego às janelas Dos palácios arruinados E cismo de dentro para fora Para me consolar do presente. Dá-me rosas, rosas, E lírios também...

Onde voce ve a teimosia alguem ve a ignorancia, um outro compreende as limitaçoes do companheiro, percebendo que cada qual caminha em seu propario passo q que é inutil querer apressar o passo do outro, a nao ser que ele deseje isso

Nem esta obra, nem as que se lhe seguirão têm nada que ver com quem as escreve. Ele nem concorda com o que nelas vai escrito, nem discorda. Como se lhe fosse ditado, escreve; e, como se lhe fosse ditado por quem fosse amigo, e portanto com razão lhe pedisse para que escrevesse o que ditava, achava interessante - porventura só por amizade - o que, ditado, vai escrevendo

Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. (...) Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo? Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca! E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído, Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? Eu, que venho sido vil, literalmente vil, Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Enquanto não encerramos um capítulo, não podemos partir para o próximo. Por isso é tão importante deixar certas coisas irem embora, soltar, desprender-se. As pessoas precisam entender que ninguém está jogando com cartas marcadas, às vezes ganhamos e às vezes perdemos. Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é.

Era uma princesa Que amou... Já não sei... Como estou esquecido! Canta-me ao ouvido E adormecerei... Que é feito de tudo? Que fiz eu de mim? Deixa-me dormir, Dormir a sorrir E seja isto o fim.

Há doenças piores que as doenças, Há dores que não doem, nem na alma Mas que são dolorosas mais que as outras. Há angústias sonhadas mais reais Que as que a vida nos traz, há sensações Sentidas só com imaginá-las Que são mais nossas do que a própria vida. Há tanta cousa que, sem existir, Existe, existe demoradamente, E demoradamente é nossa e nós... Por sobre o verde turvo do amplo rio Os circunflexos brancos das gaivotas... Por sobre a alma o adejar inútil Do que não foi, nem pôde ser, e é tudo. Dá-me mais vinho, porque a vida é nada

Num meio-dia de fim de Primavera Tive um sonho como uma fotografia. Vi Jesus Cristo descer à terra. Veio pela encosta de um monte Tornado outra vez menino, A correr e a rolar-se pela erva E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se de longe. Tinha fugido do céu. Era nosso demais para fingir De segunda pessoa da Trindade. No céu era tudo falso, tudo em desacordo Com flores e árvores e pedras. No céu tinha que estar sempre sério E de vez em quando de se tornar outra vez homem E subir para a cruz, e estar sempre a morrer Com uma coroa toda à roda de espinhos E os pés espetados por um prego com cabeça, E até com um trapo a roda da cintura Como os pretos nas ilustrações. Nem sequer o deixavam ter pai e mãe Como as outras crianças. O seu pai era duas pessoas - Um velho chamado José, que era carpinteiro, E que não era pai dele; E o outro pai era uma pomba estúpida, A única pomba feia do mundo Porque não era do mundo nem era pomba. E a sua mãe não tinha amado antes de o ter. Não era mulher: era uma mala Em que ele tinha vindo do céu. E queriam que ele, que só nascera da mãe, E nunca tivera pai para amar com respeito, Pregasse a bondade e a justiça! Um dia que Deus estava a dormir E o Espírito Santo andava a voar, Ele foi à caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido. Com o segundo criou-se eternamente humano e menino. Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado na cruz que há no céu E serve de modelo às outras. Depois fugiu para o Sol E desceu pelo primeiro raio que apanhou. Hoje vive na minha aldeia comigo. É uma criança bonita de riso e natural. Limpa o nariz ao braço direito, Chapinha nas poças de água, Colhe as flores e gosta delas e esquece-as. Atira pedras aos burros, Rouba a fruta dos pomares E foge a chorar e a gritar dos cães. E, porque sabe que elas não gostam E que toda a gente acha graça, Corre atrás das raparigas Que vão em ranchos pelas estradas Com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias. A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E olha devagar para elas. E depois, cansado, O Menino Jesus adormece nos meus braços E eu levo-o ao colo para casa. Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava. Ele é o humano que é natural, Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza Que ele é o Menino Jesus verdadeiro...

Ilusão Perdida Florida ilusão que em mim deixaste a lentidão duma inquietude vibrando em meu sentir tu juntaste todos os sonhos da minha juventude. Depois dum amargor tu afastaste-te, e a princípio não percebi. Tu partiras tal como chegaste uma tarde para alentar meu coração mergulhado na profundidade dum desencanto. Depois perfumaste-te com meu pranto, fiz-te doçura do meu coração, agora tens aridez de nó, um novo desencanto, árvore nua que amanhã se tornará germinação.

Fresta Em meus momentos escuros Em que em mim não há ninguém, E tudo é névoas e muros Quanto a vida dá ou tem, Se, um instante, erguendo a fronte De onde em mim sou aterrado, Vejo o longínquo horizonte Cheio de sol posto ou nado Revivo, existo, conheço, E, ainda que seja ilusão O exterior em que me esqueço, Nada mais quero nem peço. Entrego-lhe o coração.

No entardecer dos dias de Verão, às vezes, Ainda que não haja brisa nenhuma, parece Que passa, um momento, uma leve brisa Mas as árvores permanecem imóveis Em todas as folhas das suas folhas E os nossos sentidos tiveram uma ilusão, Tiveram a ilusão do que lhes agradaria... Ah, os sentidos, os doentes que vêem e ouvem! Fôssemos nós como devíamos ser E não haveria em nós necessidade de ilusão Bastar-nos-ia sentir com clareza e vida E nem repararmos para que há sentidos ...

Foi um Momento Foi um momento O em que pousaste Sobre o meu braço, Num movimento Mais de cansaço Que pensamento, A tua mão E a retiraste. Senti ou não ? Não sei. Mas lembro E sinto ainda Qualquer memória Fixa e corpórea Onde pousaste A mão que teve Qualquer sentido Incompreendido. Mas tão de leve!... Tudo isto é nada, Mas numa estrada Como é a vida Há muita coisa Incompreendida... Sei eu se quando A tua mão Senti pousando Sobre o meu braço, E um pouco, um pouco, No coração, Não houve um ritmo Novo no espaço? Como se tu, Sem o querer, Em mim tocasses Para dizer Qualquer mistério, Súbito e etéreo, Que nem soubesses Que tinha ser. Assim a brisa Nos ramos diz Sem o saber Uma imprecisa Coisa feliz.

Porque é que um sono agita Em vez de repousar O que em minha alma habita E a faz não descansar? Que externa sonolência, Que absurda confusão, Me oprime sem violência Me faz ver sem visão? Entre o que vivo e a vida, Entre quem estou e sou, Durmo numa descida, Descida em que não vou. E, num infiel regresso Ao que já era bruma, Sonolento me apresso Para coisa nenhuma.

O público não quer a verdade, mas a mentira que mais lhe agrade.

Arre! Estou farto de semi-deuses! Onde é que há gente no mundo???

TUDO vale a pena se a alma não é pequena

Ser feliz é encontrar força no perdão, esperanças nas batalhas, segurança no palco do medo, amor nos desencontros. É agradecer a Deus a cada minuto pelo milagre da vida.

Eu amo tudo que foi Tudo o que já não é A dor que já não me dói A antiga e erônea fé O ontem que deixou alegria Só porque foi,e voou E hoje é já outro dia

Minha alma está cansada da minha vida

Se eu te pudesse dizer Aquilo que nunca te direi, Tu terias que entender Aquilo que nem eu sei

Segue teu destino, rega tuas plantas, Ama as tuas rosas. O resto é sombra de árvores alheias..... Vê de longe a vida. Nunca a interrogues. Ela nada pode dizer-te.A resposta , está além dos Deuses.

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.

Ser feliz é deixar de ser vitima dos problemas e se tornar um autor da propia histórie. É saber falar de si mesmo. É não ter medo dos propios sentimento…

Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.

Não saber explicar o que se sente por quem vc quer a todo momento, é amar.

Enquanto houver você do outro lado, eu consigo me orientar.

Fito-te - E o teu silencio é uma cegueira minha.

Se assim aconteceu, assim está certo!

Quando te vi amei-te já muito antes. Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo. Não há cousa feliz ou hora alegre Que eu tenha tido pela vida fora, Que o não fosse porque te previa, Porque dormias nela tu futuro. (...)

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, Indesculpavelmente sujo, Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas...

O grande sol na eira Talvez seja o remédio... Não quero quem me queria, Amarem-me faz tédio. Baste-me o beijo intacto Que a luz dá a luzir E o amor alheio e abstrato De campos a florir. O resto é gente e alma: Complica, fala, vê. Tira-me o sonho e a calma E nunca é o que é.

Nada me prende, a nada me ligo, a nada pertenço. Todas as sensações me tomam e nenhuma fica. Sou mais variado que uma multidão de acaso, Sou mais diverso que o universo espontâneo, Todas as épocas me pertencem um momento, Todas as almas um momento tiveram seu lugar em mim. Fluído de intuições, rio de supor - mas, Sempre ondas sucessivas, Sempre o mar - agora desconhecendo-se Sempre separando-se de mim, indefinidamente.

Eu quero ser sempre aquilo com quem simpatizo, Eu torno-me sempre, mais tarde ou mais cedo, Aquilo com quem simpatizo, seja uma pedra ou uma ânsia, Seja uma flor ou uma idéia abstrata, Seja uma multidão ou um modo de compreender Deus. E eu simpatizo com tudo, vivo de tudo em tudo. São-me simpáticos os homens superiores porque são superiores, E são-me simpáticos os homens inferiores porque são superiores também, Porque ser inferior é diferente de ser superior, E por isso é uma superioridade a certos momentos de visão. Simpatizo com alguns homens pelas suas qualidades de caráter, E simpatizo com outros pela sua falta dessas qualidades, E com outros ainda simpatizo por simpatizar com eles, E há momentos absolutamente orgânicos em que esses são todos os homens. Sim, como sou rei como sou rei absoluto na minha simpatia, Basta que ela exista para que tenha razão de ser.

Como a noite é longa ! Como a noite é longa ! Toda a noite é assim... Senta-te, ama, perto Do leito onde esperto. Vem prao pé de mim... Amei tanta coisa... Hoje nada existe. Aqui ao pé da cama Canta-me, minha ama, Uma canção triste. Era uma princesa Que amou... Já não sei... Como estou esquecido ! Canta-me ao ouvido E adormecerei... Que é feito de tudo ? Que fiz eu de mim? Deixa-me dormir, Dormir a sorrir E seja isto o fim.

Estás só. Ninguém o sabe. Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge. Mas finge sem fingimento. Nada speres que em ti já não exista, Cada um consigo é triste. Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas, Sorte se a sorte é dada.

Encontro de dois. Olho no olho. Cara a cara. E quando estiveres perto eu arrancarei os seus olhos e os colocarei no lugar dos meus. E tu arrancara os meus olhos e os colocara no lugar dos teus. Então, eu te olharei com teus olhos e tu me olharas com os meus.

Pousa um momento, Um só momento em mim, Não só o olhar, também o pensamento. Que a vida tenha fim Nesse momento! No olhar a alma também Olhando-me, e eu a ver Tudo quanto de ti teu olhar tem. A ver até esquecer Que tu és tu também. Só tua alma sem tu Só o teu pensamento E eu onde, alma sem eu. Tudo o que sou Ficou com o momento E o momento parou.

Transforma-se o amador na coisa amada, Por virtude do muito imaginar; não tenho, logo, mais que desejar, Pois tenho em mim a parte desejada. Se nela minha alma transformada, Que deseja mais o corpo de alcançar? Em si somente pode descansar, Pois consigo tal alma está aliada. Mas esta linda e pura semidéia, Que, como acidente em seu sujeito, Assim como a alma minha se conforma, Está no pensamento como idéia; E o vivo e puro amor de que sou feito, Como a matéria sempre, busca a forma.

Quero,terei; Se não aqui; Noutro lugar que ainda não sei. Nada perdi; Tudo serei

O espelho refleti certo; só não erra porque não pensa.

Põe tudo o que és na mais pequena coisa que faças

Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir.

Nunca amamos ninguém. Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso - em suma, é a nós mesmos - que amamos. Isso é verdade em toda a escala do amor.

Cada um é muita gente. Para mim sou quem me penso, Para outros - cada um sente O que julga, e é um erro imenso.

Quem tem alma não tem calma.

Outrora eu era daqui, e hoje regresso estrangeiro, Forasteiro do que vejo e ouço, velho de mim. Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei. Eu reinei no que nunca fui.

Porque é que para ser feliz é preciso não saber?

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.

Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que sou e vejo, Torno-me eles e não eu.

Quando te vi amei-te já muito antes Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo

Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim.

O que penso eu do mundo? Sei lá o que penso do mundo! Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que importa àquele a quem já nada importa que um perca e outro vença .. se a aurora raia sempre .. se cada ano com a Primavera as folhas aparecem .. e com o Outono cessam? E o resto, as outras coisas que os humanos acrescentam à vida, que me aumentam na alma? Sim, sei bem que nunca serei alguém. Sei, enfim, que nunca saberei de mim. Sim, mas agora, enquanto dura esta hora, este luar, estes ramos, esta paz em que estamos .. deixem-me crer o que nunca poderei ser. Ser um é cadeia, ser eu é não ser. Viverei fugindo mas vivo a valer. O mistério do mundo, o íntimo, horroroso, desolado, verdadeiro mistério da existência, consiste em haver esse mistério. Quanto mais fundamente penso, mais profundamente me descompreendo. Só a inocência e a ignorância são felizes, mas não o sabem. São ou não? Que é ser sem o saber? Ser, como a pedra, um lugar, nada mais. Quanto mais claro vejo em mim, mais escuro é o que vejo. Quanto mais compreendo menos me sinto compreendido.

Quero tudo novo de novo. Quero não sentir medo. Quero me entregar mais, me jogar mais, amar mais. Viajar até cansar. Quero sair pelo mundo. Quero fins de semana de praia. Aproveitar os amigos e abraçá-los mais. Quero ver mais filmes e comer mais pipoca, ler mais. Sair mais. Quero um trabalho novo. Quero não me atrasar tanto, nem me preocupar tanto. Quero morar sozinha, quero ter momentos de paz. Quero dançar mais. Comer mais brigadeiro de panela, acordar mais cedo e economizar mais. Sorrir mais, chorar menos e ajudar mais. Pensar mais e pensar menos. Andar mais de bicicleta. Ir mais vezes ao parque. Quero ser feliz, quero sossego, quero outra tatuagem. Quero me olhar mais. Cortar mais os cabelos. Tomar mais sol e mais banho de chuva. Preciso me concentrar mais, delirar mais. Não quero esperar mais, quero fazer mais, suar mais, cantar mais e mais. Quero conhecer mais pessoas. Quero olhar para frente e só o necessário para trás. Quero olhar nos olhos do que fez sofrer e sorrir e abraçar, sem mágoa. Quero pedir menos desculpas, sentir menos culpa. Quero mais chão, pouco vão e mais bolinhas de sabão. Quero aceitar menos, indagar mais, ousar mais. Experimentar mais. Quero menos “mas”. Quero não sentir tanta saudade. Quero mais e tudo o mais. “E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.

Que pensará isto daquilo? Nada pensa nada Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem? Se ela a tiver que a tenha... Que me importa isso? Se eu pensasse nessas coisas deixaria de ver as árvores e as plantas E deixaria de ver a Terra para ver só os meus pensamentos... Entristecia e ficava às escuras E assim, sem pensar, tenho a Terra e o Céu

A tua voz fala amorosa... Tão meiga fala que me esquece Que é falsa a sua branda prosa. Meu coração desentristece. Sim, como a música sugere O que na música não stá, Meu coração nada mais quer Que a melodia que em ti há... Amar-me? Quem o crera? Fala Na mesma voz que nada diz Se és uma música que embala. Eu ouço, ignoro, e sou feliz. Nem há felicidade falsa, Enquanto dura é verdadeira. Que importa o que a verdade exalça Se sou feliz desta maneira?

HORA ABSURDA O TEU SILÊNCIO é uma nau com tôdas as velas pandas... Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso... E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas Com que me finjo mais alto e ao pé de qualquer paraiso... Meu coração é uma ânfora que cai e que se parte... O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, partido, a um canto... Minha idéia de ti é um cadáver que o mar traz à praia..., e entanto Tu és a tela irreal em que erro em côr a minha arte... Abre tôdas as portas e que o vento varra a idéia Que temos de que um fumo perfuma de ócio os salões... Minha alma é uma caverna enchida pla maré cheia, E a minha idéia de te sonhar uma caravana de histriões... Chove ouro baço, mas não no lá-fora...É em mim...Sou a Hora, E a Hora é de assombros e tôda ela escombros dela... Na minha atenção há uma viúva pobre que nunca chora... No meu céu interior nunca houve uma única estrela... Hoje o céu é pesado como a idéia de nunca chegar a um pôrto... A chuva miúda é vazia...A Hora sabe a ter sido... Não haver qualquer coisa como leitos para as naus!...Absorto Em se alhear de si, teu olhar é uma praga sem sentido... Tôdas as minhas horas são feitas de jaspe negro, Minhas ânsias tôdas talhadas num mármore que não há, Não é alegria nem dor esta dor com que me alegro, E a minha bondade inversa não é nem boa nem má... Os feixes dos lictores abriram-se à beira dos caminhos... Os pendões das vitórias medievais nem chegaram às cruzadas... Puseram in-fólios úteis entre as pedras das barricadas... E a erva cresceu nas vias férreas com viços daninhos... Ah, como esta hora é velha!... E tôdas as naus partiram! Na praia só um cabo morto e uns restos de vela falam De longe, das horas do Sul, de onde os nossos sonhos tiram Aquela angústia de sonhar mais que até para si calam... O palácio está em ruínas... Dói ver no parque o abandono Da fonte sem repuxo... Ninguém ergue o olhar da estrada E sente saudade de si ante aquêle lugar-outono... Esta paisagem é um manuscrito com a frase mais bela cortada... A doida partiu todos os candelabros glabros, Sujou de humano o lago com cartas rasgadas, muitas... E a minha alma é aquela luz que não mais haverá nos candelabros... E que querem ao lago aziago minhas ânsias, brisas fortuitas?... Por que me aflijo e me enfermo?...Deitam-se nuas ao luar Tôdas as ninfas... Veio o sol e já tinham partido... O teu silêncio que me embala é a idéia de naufragar, E a idéia de a tua voz soar a lira dum Apolo fingido... Já não há caudas de pavões tôdas olhos nos jardins de outrora... As próprias sombras estão mais tristes...Ainda Há rastros de vestes de aias (parece) no chão, e ainda chora Um como que eco de passos pela alamêda que eis finda... Todos os ocasos fundiram-se na minha alma... As relvas de todos os prados foram frescas sob meus pés frios... Secou em teu olhar a idéia de te julgares calma, E eu ver isso em ti é um pôrto sem navios... Ergueram-se a um tempo todos os remos...pelo ouro das searas Passou uma saudade de não serem o mar...Em frente Ao meu trono de alheamento há gestos com pedras raras... Minha alma é uma lâmpada que se apagou e ainda está quente... Ah, e o teu silêncio é um perfil de píncaro ao sol! Tôdas as princesas sentiram o seio oprimido... Da última janela do castelo só um girassol Se vê, e o sonhar que há outros põe brumas no nosso sentido... Sermos, e não sermos mais!... Ó leões nascidos na jaula!... Repique de sinos para além, no Outro Vale... Perto?... Arde o colégio e uma criança ficou fechada na aula... Por que não há de ser o Norte e Sul?... O que está descoberto?... E eu deliro... De repente pauso no que penso...Fito-te... E o teu silêncio é uma cegueira minha...Fito-te e sonho... Há coisas rubras e cobras no modo como medito-te, E a tua idéia sabe à lembrança de um sabor de medonho... Para que não ter por ti desprêzo? Por que não perdê-lo?... Ah, deixa que eu te ignore...O teu silêncio é um leque --- Um leque fechado, um leque que aberto seria tão belo, tão belo, Mas mais belo é não o abrir, para que a Hora não peque... Gelaram tôdas as mãos cruzadas sôbre todos os peitos.... Murcharam mais flôres do que as que havia no jardim... O meu amar-te é uma catedral de silêncio eleitos, E os meus sonhos uma escada sem princípio mas com fim... Alguém vai entrar pela porta...Sente-se o ar sorrir... Tecedeiras viúvas gozam as mortalhas de virgens que tecem... Ah, o teu tédio é uma estátua de uma mulher que há de vir, O perfume que os crisântemos teriam, se o tivessem... É preciso destruir o propósito de tôdas as pontes, Vestir de alheamento as paisagens de tôdas as terras, Endireitar à fôrça a curva dos horizontes, E gemer por ter de viver, como um ruído brusco de serras... Há tão pouca gente que ame as paisagens que não existem!... Saber que continuará a haver o mesmo mundo amanhã --- como nos desalegra!... Que o meu ouvir o teu silêncio não seja nuvens que atristem O teu sorriso, anjo exilado, e o teu tédio, auréola negra... Suave, como ter mãe e irmãs, a tarde rica desce... Não chove já, e o vasto céu é um grande sorriso imperfeito... A minha consciência de ter consciência de ti é uma prece, E o meu saber-te a sorrir é uma flor murcha a meu peito... Ah, se fôssemos duas figuras num longínquo vitral!... Ah, se fôssemos as duas côres de uma bandeira de glória!... Estátua acéfala posta a um canto, poeirenta pia batismal, Pendão de vencidos tendo escrito ao centro êste lema --- Vitória! O que é que me tortura?... Se até a tua face calma Só me enche de tédios e de ópios de ócios medonhos... Não sei...Eu sou um doido que estranha a sua própria alma... Eu fui amado em efígie num país para além dos sonhos... 4-7-1913

Dorme enquanto eu velo... Deixa-me sonhar... Nada em mim é risonho. Quero-te para sonho, Não para te amar. A tua carne calma É fria em meu querer. Os meus desejos são cansaços. Nem quero ter nos braços Meu sonho do teu ser. Dorme, dorme. dorme, Vaga em teu sorrir... Sonho-te tão atento Que o sonho é encantamento E eu sonho sem sentir.

Meus amigos são todos assim: metade loucura, outra metade santidade. Escolho-os não pela pele, mas pela pupila, que tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. Escolho meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta. Não quero só o ombro ou o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos. Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos, nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice. Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto, e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou, pois vendo-os loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão imbecil e estéril

Eu tenho uma espécie de dever, de dever de sonhar, de sonhar sempre, pois sendo mais do que um espectador de mim mesmo, Eu tenho que ter o melhor espetáculo que posso. E assim me construo a ouro e sedas, em salas supostas, invento palco, cenário para viver o meu sonho entre luzes brandas e músicas invisíveis.

Quem tem dois corações Me faça presente de um Que eu já fui dono de dois E já não tenho nenhum Dá-me beijos, dá-me tantos Que enleado em teus encantos Preso nos abraços teus Eu não sinta a própria vida Nem minh’alma ave perdida No azul amor dos teus céus Botão de rosa menina Carinhosa, pequenina Corpinho de tentação Vem morar na minha vida Dá em ti terna guarida Ao meu pobre coração Quando passo um dia inteiro Sem ver o meu amorzinho Cobre-me um frio de janeiro No junho do meu carinho.

Andressa Belini Menezes rs Quero ser o teu amor amigo. Nem demais e nem de menos. Nem tão longe e nem tão perto. Na medida mais precisa que eu puder. Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida, Da maneira mais discreta que eu souber. Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar. Sem forçar tua vontade. Sem falar, quando for hora de calar. E sem calar, quando for hora de falar. Nem ausente, nem presente por demais. Simplesmente, calmamente, ser-te paz. É bonito ser amor amigo, mas confesso é tão difícil aprender! E por isso eu te suplico paciência. Vou encher este teu rosto de lembranças, Dá-me tempo, de acertar nossas distâncias...

Nada se sabe,tudo se imagina.

A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos não é o que vemos, senão o que somos.

O poeta é um fingidor, finge tão completamente que chega fingir que é dor, a dor que deveras sente

Não é por nada que olho: é que eu gosto de ver as pessoas sendo.

Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei.

Sobre as emoções tenho curiosidade. Sobre os fatos, quaisquer que venham a ser, não tenho curiosidade alguma.

Aquele que conheceu apenas a uma MULHER E AMOU DE VERDADE, sabe muito mais das mulheres doque aquele que conheceu a mil.

Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu

Para ser grande, sê inteiro

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares.

Manda quem não sente. Vence quem pensa só o que precisa para vencer.

Mesmo a ausência dele é uma coisa que está comigo. E eu gosto tanto dele que não sei como o desejar.

Tudo aquilo que é realmente nosso nunca se vai para sempre.

Há tanta suavidade em nada dizer e tudo entender...

Saber não ter ilusões é absolutamente necessário para se poder ter sonhos.

Somos do tamanho que sonhamos.

E a minha alma alegra-se com seu sorriso, um sorriso amplo e humano, como o aplauso de uma multidão

O meu coração quebrou-se Como um bocado de vidro Quis viver e enganou-se...

Porque sentir é como o céu, Vê-se mais não há nele que ver.

O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.

Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva Não faz ruído senão com sossego. Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva Do que não sabe, o sentimento é cego. Chove. Meu ser (quem sou) renego… Tão calma é a chuva que se solta no ar (Nem parece de nuvens) que parece Que não é chuva, mas um sussurrar Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece. Chove. Nada apetece… Não paira vento, não há céu que eu sinta. Chove longínqua e indistintamente, Como uma coisa certa que nos minta, Como um grande desejo que nos mente. Chove. Nada em mim sente…

Que suave é o ar! Como parece Que tudo é bom na vida que há! Assim meu coração pudesse Sentir essa certeza já. Mas não; ou seja a selva escura Ou seja um Dante mais diverso, A alma é literatura E tudo acaba em nada e verso.

Tão abstrata é a idéia do teu ser... Dobre - Peguei no meu coração... Quem te disse ao ouvido esse segredo... Abdicação: Toma-me, ó noite eterna... Dorme enquanto eu velo... deixa-me sonhar... Põe as mãos nos ombros... beija-me na fronte... Ao longe, ao luar, no rio uma vela... Sonho. Não sei quem sou neste momento... Contemplo o lago mudo que uma brisa estremece... Gato que brincas na rua como se fose na cama... Não: não digas nada! Vaga, no azul amplo solta, vai uma nuvem errando... O Andaime: O tempo que eu hei sonhado... Sorriso audível das folhas... Autopsicografia: O poeta é um fingidor... O que me dói não é o que há no coração... Entre o sono e o sonho... Tudo o que faço ou medito fica sempre na metade. Tenho tanto sentimento que... Viajar! Perder países! Grandes mistérios habitam o limiar do meu ser... Fresta: Em meus momentos escuros... Eros e Psique: Conta a lenda que dormia uma princesa... Teus olhos entristecem. Nem ouves o que digo... Liberdade: Ai que prazer não cumprir um dever... Hora Absurda - O teu silêncio é uma nau...

Persiga um sonho, mas não deixe ele viver sozinho. Descubra-se todos os dias, deixe-se levar pelas vontades, mas não enlouqueça por elas. Procure, sempre procure o fim de uma história, seja ela qual for. Dê um sorriso para quem esqueceu como se faz isso. Acelere seus pensamentos, mas não permita que eles te consumam. Olhe para o lado, alguém precisa de você. Abasteça seu coração de fé, não a perca nunca. Mergulhe de cabeça nos seus desejos e satisfaça-os. Procure os seus caminhos, mas não magoe ninguém nessa procura. Arrependa-se, volte atrás, peça perdão! Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se achá-lo, segure-o!

O amor quer a posse, mas não sabe o que é a posse. Se eu não sou meu, como serei teu, ou tu minha? Se não possuo o meu próprio ser, como possuirei um ser alheio? Se sou já diferente daquele de quem sou idêntico, como serei idêntico daquele de quem sou diferente? O amor é um misticismo que quer praticar-se, uma impossibilidade que só é sonhada como devendo ser realizada. in O Rio da Posse

Por que é que, pra ser feliz, É preciso não sabê-lo?

Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é.

Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter, repugna-la-íamos, se a tivéssemos. O perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito.

Esperar pelo melhor é preparar#8209;se para o perder: eis a regra. O pessimismo é bem grande, é fonte de energia.

Não sei o que sinto, não sei o que quero, não sei o que penso nem o que sou.

Matar o sonho é matarmo-nos. É mutilar a nossa alma. O sonho é o que temos de realmente nosso, de impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso.

Quem não vê bem uma palavra, não pode ver bem uma alma.

O próprio sonho me castiga. Adquiri nele tal lucidez que vejo como real cada coisa que sonho.

Acontece-me às vezes, (...) um cansaço tão terrível da vida que não há sequer hipótese de dominá-lo.

Porque eu desejo impossivelmente o possível, porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser, ou até se não puder ser...

É por isso que tomo ópio, é um remédio.Sou um convalescente do momento, moro no Rés do chão do pensamento e ver passar a vida faz-me tédio

Um poema é a expressão de idÉias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso.

Tudo quanto penso Tudo quanto sou É um deserto imenso Onde nem eu estou

Mudem-me os deuses os sonhos, mas não o dom de sonhar.

Uma vontade de sono no corpo,um desejo de não pensar na alma,e por cima de tudo uma transparência lúcida do entendimento retrospectivo...

Jamais desista de ser feliz, pois a vida é um espetáculo imperdível, ainda que se apresentem dezenas de fatores a demonstrarem o contrário.

Tudo é orgulho e inconsciência. Tudo é querer mexer-se, fazer cousas, deixar rastro. E houve pasmos de toda a realidade ser só isto/ Mas a vida era a vida e só era a vida

O dia em que eu como passáro,deixar-me escapulir num vôou,´penetrarei em teu coração e tua presença me possuirá para sempre Sua imagem pecorre meus sonhos como uma sombra,sua voz me invade meus sentidos como um sonho. Os grandes momentos da vida vêem por si mesmos... ...não faz sentido esperar por eles. seu carinho me companha. O valor das coisas não estar no tempo que elas dura, mas na intensidade que acontecem. Por isso Existem momentos inesquecíveis e pesoas incoparevéis.

Sonhe com as estrelas, apenas sonhe, elas só podem brilhar no céu. Não tente deter o vento, ele precisa correr por toda parte, ele tem pressa de chegar, sabe-se lá aonde. ...

Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente! Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-as. Se perder um amor, não se perca!... Se o achar, segure-o! Circunde-se de rosas e ame... O mais é nada.

Liberdade Ai que prazer Não cumprir um dever, Ter um livro para ler E não o fazer! Ler é maçada, Estudar é nada. O sol doira Sem literatura. O rio corre, bem ou mal, Sem edição original. E a brisa, essa, De tão naturalmente matinal, Como tem tempo não tem pressa… Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto é melhor, quando há bruma, Esperar por D. Sebastião, Quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças… Mas o melhor do mundo são as crianças, Flores, música, o luar, e o sol, que peca Só quando, em vez de criar, seca. O mais do que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças Nem consta que tivesse biblioteca…

Enquanto não encerramos um capítulo, não podemos partir para o próximo. Por isso é tão importante deixar certas coisas irem embora, soltar, desprender-se. As pessoas precisam entender que ninguém está jogando com cartas marcadas, ás vezes ganhamos e ás vezes perdemos. Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é.

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas que já não têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia... E se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre, à margem de nós mesmos.

Quem me dera eu fosse pó que rola na estrada e os pés dos pobres me tivessem pisando. Quem me dera eu fosse o burro do moleiro e que ele me batesse e me estimasse. Antes isso do que ser aquele que passa pela vida olhando pra traz, sentindo pena.

Não me indigno, porque a indignação é para os fortes; não me resigno, porque a resignação é para os nobres; não me calo, porque o silêncio é para os grandes. E eu não sou forte, nem nobre, nem grande. Sofro e sonho. Queixo-me porque sou fraco e, porque sou artista, entretenho-me a tecer musicais as minhas queixas e a arranjar meus sonhos conforme me parece melhor a minha ideia de os achar belos. Só lamento o não ser criança, para que pudesse crer nos meus sonhos. Eu não sou pessimista, sou triste.

Para quê olhar para os crepúsculos se tenho em mim milhares de crepúsculos diversos - alguns dos quais que o não são - e se, além de os olhar dentro de mim, eu próprio os sou, por dentro?

Por que é que me gela meu próprio pensar em sonhar amar?

Sentir é criar. Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o universo não tem ideias.

Tenho fome da extensão do tempo, e quero ser eu sem condições.

Penso em ti e dentro de mim estou completa. (...) Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz.

O mundo é para quem pode conquistá-lo e não para quem pensa que pode conquistá-lo.

Toda a noite, toda a noite, toda a noite sem pensar... Toda a noite sem dormir e sem tudo isso acabar.

Só de sentir o vento passar, já valeu a pena viver.

Os outros nunca sentem. Quem sente somos nós, Sim, todos nós, Até eu, que neste momento já não estou sentindo nada. Nada? Não sei… Um nada que dói…

Tudo em meu torno é o universo nu, abstrato, feito de negações noturnas. Divido-me em cansado e inquieto, e chego a tocar com a sensação do corpo um conhecimento metafísico do mistério das coisas.

Faz bem só pensar em ver...

Tenho dito tantas vezes, quanto sofro sem sofrer, que me canso dos revezes, que sonho só para os não ter.

A impossibilidade de tudo quanto eu nem chego a sonhar

E pode levantar-me desta poltrona deixando os sonhos no chão...

Que sonhos?... Eu não sei se sonhei...Que naus partiram, para onde? Tive essa impressão sem nexo porque no quadro fronteiro Naus partem - naus não, barcos, mas as naus estão em mim,

Onde tenho o meu pensamento que me dói estar sem ele,

Não há substância de pensamento na matéria de alma com que penso...

Há METAFÍSICA bastante em não pensar nada.

Estou num dia em que me pesa, como uma entrada no cárcere, a monotonia de tudo. O mundo é coisas destacadas e arestas diferentes; mas, se somos míopes, é uma névoa insuficiente e contínua. O meu desejo é fugir. (...) Quero não ver mais estes rostos, estes hábitos e estes dias. Desejo partir (...) para o lugar qualquer que tenha em si o não ser este lugar.

“A paixão é um pânico das emoções, e como o pânico — que nisto se distingue do medo — estilhaça a inibição, desorienta o espírito, vira o indivíduo contra as suas próprias aquisições mentais superiores, e muitas vezes o conduz a fazer o que mal sabe que faz, ou que a própria paixão se fosse menor, como o pânico se não fosse mais que medo, o levaria ou aconselharia a não fazer.

Viajar? Para viajar basta existir. Vou de dia para dia, como de estação para estação, no comboio do meu corpo, ou do meu destino, debruçado sobre as ruas e as praças, sobre os gestos e os rostos, sempre iguais e sempre diferentes, como, afinal, as paisagens são. Se imagino, vejo. Que mais faço eu se viajo? Só a fraqueza extrema da imaginação justifica que se tenha que deslocar para sentir. “Qualquer estrada, esta mesma estrada de Entepfuhl, te levará até ao fim do mundo”. Mas o fim do mundo, desde que o mundo se consumou dando-lhe a volta, é o mesmo Entepfuhl de onde se partiu. Na realidade, o fim do mundo, como o princípio, é o nosso conceito do mundo. É em nós que as paisagens têm paisagem. Por isso, se as imagino, as crio; se as crio, são; se são, vejo-as como às outras. Para quê viajar? Em Madrid, em Berlim, na Pérsia, na China, nos Pólos ambos, onde estaria eu senão em mim mesmo, e no tipo e género das minhas sensações? A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos, não é o que vemos, senão o que somos.

Não: Não quero nada. Já disse que não quero nada. Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer. Não me tragam estéticas! Não me falem em moral! ... Se têm a verdade, guardem-a! Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica. Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo. Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Assim, como sou, tenham paciência! Vão para o diabo sem mim, Ou deixem-me ir sozinho para o diabo! Para que havermos de ir juntos? Não me peguem no braço! Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho. Já disse que sou sozinho! Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul - o mesmo da minha infância - Eterna verdade vazia e perfeita! Ó macio Tejo ancestral e mudo, Pequena verdade onde o céu se reflete! ... Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Que idéia tenho eu das cousas? Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos? Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma E sobre a criação do Mundo? Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos Enão pensar. É correr as cortinas Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

Sou o que penso, mas penso ser tantas coisas.

Sou definitivamente contra o definido, porque o definido é o bastante e o bastante não basta

Sem verdade, sem dúvida, nem dono. Boa é a vida, mas melhor é o vinho. O amor é bom, mas é melhor o sono.

Descobri que a leitura é uma espécie de sonho escravizador, se devo sonhar porque não sonhar os meus próprios sonhos.

Assim em cada lago a lua toda Brilha, porque alta vive.

Sei que nunca terei o que procuro E que nem sei buscar o que desejo, Mas busco, insciente, no silêncio escuro E pasmo do que sei que não almejo.

Navegar é preciso; viver não é preciso

Navegar é preciso. Viver não.

As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora.Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se.

Sou metade sonânbulo e outra parte nada

Há tanta suavidade em nada se dizer e tudo se entender.

G. Junqueiro? Tenho uma grande indiferença pela obra dele. Já o vi... Nunca pude admirar um poeta que me foi possível ver.

Sou feito das ruínas do inacabado e é uma paisagem de desistências que definiria meu ser.

Mesmo a circunstância de eu ir publicar um livro vem alterar a minha vida. Perco uma coisa - o ser inédito.

E perder um defeito, ou uma deficiência, ou uma negação, sempre é perder.

Este livro é a biografia de alguém que nunca teve vida...

E subia-nos o choro à lembrança, porque nem aqui, ao sermos felizes, o éramos...

E nós não nos peruntávamos para que era aquilo, porque gozávamos o saber que aquilo não era para nada.

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério! O único mistério é haver quem pense no mistério. Quem está ao sol e fecha os olhos, Começa a não saber o que é o sol E a pensar muitas cousas cheias de calor. Mas abre os olhos e vê o sol, E já não pode pensar em nada, Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos

Não só quem nos odeia ou nos inveja Nos limita e oprime; quem nos ama Não menos nos limita. Que os deuses me concedam que, despido De afetos, tenh a fria liberdade Dos píncaros sem nada. Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada É livre; quem não tem, e não deseja, Homem, é igual aos deuses.

Tenho tanto sentimento Que é frequente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Dantes eu queria Embeber-me nas árvores, nas flores, Sonhar nas rochas, mares, solidões. Hoje não, fujo dessa idéia louca: Tudo o que me aproxima do mistério Confrange-me de horror. Quero hoje apenas Sensações, muitas, muitas sensações, De tudo, de todos neste mundo — humanas, Não outras de delírios panteístas Mas sim perpétuos choques de prazer Mudando sempre, Guardando forte a personalidade Para sintetizá-las num sentir. Quero Afogar em bulício, em luz, em vozes, — Tumultuárias [cousas] usuais — o sentimento da desolação Que me enche e me avassala. Folgaria De encher num dia, [...] num trago, A medida dos vícios, inda mesmo Que fosse condenado eternamente — Loucura! — ao tal inferno, A um inferno real.

Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio. E lembra-te: Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o!

O Universo não é uma idéia minha. A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha. A noite não anoitece pelos meus olhos, A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos. Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos A noite anoitece concretamente E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso

Com este sonhar tudo, tudo na vida te farás sofreres mais. Será a tua cruz.

E tudo aquilo - todas esta frescura lenta da manhã leve, era análogo a uma alegria que ele nunca pudera ter.

Exprimir é sempre errar.

Assim éramos nós obscuradamente dois, nenhum de nós sabendo bem se o outro não era ele-próprio, se o incerto outro viveria...

O meu ideal seria viver tudo em romance, repousando na vida - ler as minhas emoções, viver o meu desprezo delas.

Lá fora passarão civilizações, escacharão revoltas, turbilhonarão festas, correrão mansos quotidianos povos.. E nós, ó meu amor irreal, teremos sempre o mesmo gesto inútil, a mesma existência falsa.

A recordação é uma traição à natureza, Porque a natureza de ontem não é natureza. O que foi não é nada, e lembrar é não ver.

“Eu sou o intervalo entre o meu querer e o que a vontade dos outros fez de mim.”

A caixa que não tem tampa Fica sempre destapada Dá-me um sorriso dos teus Porque não quero mais nada.

São as minhas confissões, e, se nelas nada digo é que nada tenho que dizer.

Seja onde estiver e a monotonia da vida cotidiana será para mim como a recordação dos amores que me não foram advindos ou dos triunfos que não haveriam de serem meus.

-Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.

Tão abstrata é a idéia do teu ser que me vem de te olhar, que, ao entreter os meus olhos nos teus, perco-os de vista.

Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo? Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

O coração se pudesse pensar pararia

Ama como ama o amor

Minha Vida é Feita de tristezas felicidades e ao mesmo tempo amor

Horóscopo de Mulher O carácter é um pouco egoísta, independente, teimoso e autoritário (sobretudo para os inferiores sociais), se bem que estas qualidades sejam compensadas por qualidades sociais intensas e efusivas. Há uma acentuada ambição, sobretudo social, uma forte intuição das coisas práticas, e um grande poder de dominar, uma grande força de vontade e tenacidade. Isto apesar de ser fácil de zangar, impulsiva, tendente a ir até ao exagero em tudo, tanto que muitas vezes terá de se arrepender de atos impulsivos, cujas consequências nem sempre serão agradáveis. A excitabilidade nervosa é grande e deve sempre evitar coisas que a preocupem e tudo quanto possa incidir sobre os nervos, sobretudo as emoções muito fortes, que não tem a resistência precisa para suportar. Há uma certa propensão para a tristeza, que pode às vezes chegar até à melancolia, isto muito embora haja uma grande disposição para tudo quanto representa passatempo e diversões. Em todo o caso, há muita espontaneidade e sinceridade e uma grande impressionabilidade às coisas da vida social. O espírito é engenhoso, imaginativo, sempre irrequieto, com facilidade em arranjar soluções para as dificuldades que lhe possam surgir, e é ao mesmo tempo preocupado e instável, sendo, porém, no fundo, intenso e violento em tudo. Há uma grande dose de subtileza e diplomacia feminina.

Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado . Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era que um via uma coisa e outro outra, ou um via um lado das coisas e outro um lado diferente. Não: cada um via as coisas exatamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro. Mas cada um via uma coisa diferente, e cada um portanto, tinha razão. Fiquei confuso desta dupla existência da verdade.

Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O ÊXITO ESTÁ EM TER ÊXITO e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?

Tudo o que faço ou medito Fica sempre na metade. Querendo, quero o infinito. Fazendo, nada é verdade. Que nojo de mim me fica Ao olhar para o que faço! Minha alma é lúcida e rica, E eu sou um mar de sargaço.

Uma flor acaso tem beleza? Tem beleza acaso um fruto? Não: têm cor e forma E existência apenas. A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão. Não significa nada. Então por que digo eu das coisas: são belas? Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos

As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará.Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira.

Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és..E lembra-te : “Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão”

Se estou só, quero não estar, Se não estou, quero estar só, Enfim, quero sempre estar Da maneira que não estou. Ser feliz é ser aquele. E aquele não é feliz, Porque pensa dentro dele E não dentro do que eu quis. A gente faz o que quer Daquilo que não é nada, Mas falha se o não fizer, Fica perdido na estrada

O amor quando se revela

Teus medos tinham coral e praias e arvoredos.

E a minha alma alegra-se com seu sorriso, um sorriso amplo e humano, como o aplauso de uma multidão

Tenho amigos para saber quem eu sou, pois vendo-os loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão imbecil e estéril.

O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis

Eu não sei senão amar-te, Nasci para te querer. Ó quem me dera beijar-te, E beijar-te até morrer.

Nada me o abismo deu ou o céu mostrou. Só o vento volta onde estou toda e só, E tudo dorme no confuso mundo.

Eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.

Basta pensar em sentir Para sentir em pensar

Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer.

Sou um evadido. Logo que nasci Fecharam-me em mim, Ah, mas eu fugi. Se a gente se cansa Do mesmo lugar, Do mesmo ser Por que não se cansar? Minha alma procura-me Mas eu ando a monte, Oxalá que ela Nunca me encontre. Ser um é cadeia, Ser eu é não ser. Viverei fugindo Mas vivo a valer.

Há tanta coisa que, sem existir, Existe, existe demoradamente, E demoradamente é nossa e nós... Por sobre o verde turvo do amplo rio Os circunflexos brancos das gaivotas... Por sobre a alma o adejar inútil Do que não foi, nem pôde ser, e é tudo. Dá-me mais vinho, porque a vida é nada.

Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final.Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos que já se acabaram.As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará. Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade.Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira.

Eu amo tudo o que foi Tudo o que já não é A dor que já não me dói A antiga e errônea fé O ontem que a dor deixou ...O que deixou alegria Só porque foi, e voou E hoje é já outro dia. --Eu amo tudo o que foi Tudo o que já não é A dor que já não me dói A antiga e errônea fé O ontem que a dor deixou ...O que deixou alegria Só porque foi, e voou E hoje é já outro dia.

Onde Pus a Esperança Onde pus a esperança, as rosas Murcharam logo. Na casa, onde fui habitar, O jardim, que eu amei por ser Ali o melhor lugar, E por quem essa casa amei - Decerto o achei, E, quando o tive, sem razão para o ter Onde pus a feição, secou A fonte logo. Da floresta, que fui buscar Por essa fonte ali tecer Seu canto de rezar - Quando na sombra penetrei, Só o lugar achei Da fonte seca, inútil de se ter. Para quê, pois, afeição, esperança, Se tê-las sabe a não as ter? Que as uso, a causa para as usar, Se tê-las sabe a não as ter? Crer ou amar - Até à raiz, do peito onde alberguei Tais sonhos e os gozei, O vento arranque e leve onde quiser E eu os não possa achar!

Tenho Dó das Estrelas Tenho dó das estrelas Luzindo há tanto tempo, Há tanto tempo… Tenho dó delas. Não haverá um cansaço Das coisas, De todas as coisas Como das pernas ou de um braço? Um cansaço de existir, De ser, Só de ser, O ser triste brilhar ou sorrir… Não haverá, enfim, Para as coisas que são, Não morte, mas sim Uma outra espécie de fim, Ou uma grande razão – Qualquer coisa assim Como um perdão?

Gastei tudo que não tinha. Sou mais velho do que sou. A ilusão, que me mantinha, Só no palco era rainha: Despiu-se, e o reino acabou. (...) Que fiz de mim? Encontrei-me Quando estava já perdido. Impaciente deixei-me Como a um louco que teime No que lhe foi desmentido.

D. SEBASTIÃO, Rei de Portugal... Louco, sim, louco, porque quis grandeza Qual a Sorte a não dá. Não coube em mim minha certeza; Por isso onde o areal está Ficou meu ser que houve, não o que há. Minha loucura, outros que me a tomem Com o que nela ia. Sem a loucura que é o homem Mais que a besta sadia, Cadáver adiado que procria?

O Guardador de Rebanhos V Há metafísica bastante em não pensar em nada. O que penso eu do mundo? Sei lá o que penso do mundo! Se eu adoecesse pensaria nisso. Que ideia tenho eu das coisas? Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos? Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma E sobre a criação do mundo? Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos E não pensar. É correr as cortinas Da minha janela (mas ela não tem cortinas). O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério! O único mistério é haver quem pense no mistério. Quem está ao sol e fecha os olhos, Começa a não saber o que é o Sol E a pensar muitas coisas cheias de calor. Mas abre os olhos e vê o Sol, E já não pode pensar em nada, Porque a luz do Sol vale mais que os pensamentos De todos os filósofos e de todos os poetas. A luz do Sol não sabe o que faz E por isso não erra e é comum e boa. Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores? A de serem verdes e copadas e de terem ramos E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar, A nós, que não sabemos dar por elas. Mas que melhor metafísica que a delas, Que é a de não saber para que vivem Nem saber que o não sabem? «Constituição íntima das coisas»... «Sentido íntimo do Universo»... Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada. É incrível que se possa pensar em coisas dessas. É como pensar em razões e fins Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão. Pensar no sentido íntimo das coisas É acrescentado, como pensar na saúde Ou levar um copo à água das fontes. O único sentido íntimo dos coisas É elas não terem sentido íntimo nenhum. Não acredito em Deus porque nunca o vi. Se ele quisesse que eu acreditasse nele, Sem dúvida que viria falar comigo E entraria pela minha porta dentro Dizendo-me: Aqui estou! (...)

Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver. Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos que já se acabaram. As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos. Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará. Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo - nada é insubst...ituível, um hábito não é uma necessidade. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira.

Emoção e Poesia Quem quer que seja de algum modo um poeta sabe muito bem quão mais fácil é escrever um bom poema (se os bons poemas se acham ao alcance do homem) a respeito de uma mulher que lhe interessa muito do que a respeito de uma mulher pela qual está profundamente apaixonado. A melhor espécie de poema de amor é, em geral, escrita a respeito de uma mulher abstrata. Uma grande emoção é por demais egoísta; absorve em si própria todo o sangue do espírito, e a congestão deixa as mãos demasiado frias para escrever. Três espécies de emoções produzem grande poesia - emoções fortes e profundas ao serem lembradas muito tempo depois; e emoções falsas, isto é, emoções sentidas no intelecto. Não a insinceridade, mas sim, uma sinceridade traduzida, é a base de toda a arte.

A única atitude intelectual digna de uma criatura superior é a de uma calma e fria compaixão por tudo quanto não é ele próprio. Não que essa atitude tenha o mínimo cunho de justa e verdadeira; mas é tão invejável que é preciso tê-la.

Tantas vezes, tantas, como agora, me tem pesado sentir que sinto – sentir como angústia só por ser sentir, a inquietação de estar aqui, a saudade de outra coisa que se não conheceu, o poente de todas as emoções… Ah, quem me salvará de existir? Não é a morte que quero, nem a vida: é aquela outra coisa que brilha no fundo da ânsia…”

Amei-te e por te amar Só a ti eu não via… Eras o céu e o mar, Eras a noite e o dia… Só quando te perdi É que eu te conheci… Quando te tinha diante Do meu olhar submerso Não eras minha amante… Eras o Universo… Agora que te não tenho, És só do teu tamanho. Estavas-me longe na alma, Por isso eu não te via… Presença em mim tão calma, Que eu a não sentia. Só quando meu ser te perdeu Vi que não eras eu. Não sei o que eras. Creio Que o meu modo de olhar, Meu sentir meu anseio Meu jeito de pensar… Eras minha alma, fora Do Lugar e da Hora… Hoje eu busco-te e choro Por te poder achar Não sequer te memoro Como te tive a amar… Nem foste um sonho meu… Porque te choro eu? Não sei… Perdi-te, e és hoje Real no […] real… Como a hora que foge, Foges e tudo é igual A si-próprio e é tão triste O que vejo que existe. Em que és […] fictício, Em que tempo parado Foste o (…) cilício Que quando em fé fechado Não sentia e hoje sinto Que acordo e não me minto…

Quem escreverá a história do que poderia ter sido o irreparável do meu passado; Este é o cadáver. Se a certa altura eu tivesse me voltado para a esquerda, ao invés que para direita; Se em certo momento eu tivesse dito não, ao invés que sim; Se em certas conversas eu tivesse dito as frases que só hoje elaboro; Seria outro hoje, e talvez o universo inteiro seria insensivelmente levado a ser outro também.

É melhor que não digas nada: sê!

Não há normas. Todos os homens são excepção a uma regra que não existe.

Liberdade Ai, que prazer / Não cumprir um dever.(...)

Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter; repugna-la-íamos, se a tivéssemos. O perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito.

Afinal, se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo!

Nós nunca nos realizamos. Somos dois abismos - um poço fitando o céu.

Um livro onde qualquer um escreve torna-se um livro sem credibilidade

O que me dói não é o que há no coração, mas essas coisas lindas, que jamais existirão...

O Mundo não se fez para pensarmos nele, mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Quer pouco: terás tudo. Quer nada: serás livre

Mas talvez não chegar queira dizer que há outra estrada que achar,certa estrada que está,como quando da festa se esquece quem lá está

Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho.

As distâncias maiores que devemos percorrer estão dentro de nós mesmos

Segue o teu destino... Rega as tuas plantas; Ama as tuas rosas. O resto é a sombra de árvores alheias

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o!

Pedi tão pouco à vida e esse mesmo pouco a vida me negou. Uma réstia de parte do sol, um campo, um bocado de sossego com um bocado de pão, não me pesar muito o conhecer que existo, e não exigir nada dos outros nem exigirem eles nada de mim. Isto mesmo me foi negado, como quem nega a esmola não por falta de boa alma, mas para não ter que desabotoar o casaco.

Tenho amor a isto, talvez porque não tenha mais nada que amar - ou talvez, também, porque nada valha o amor de uma alma, e, se temos por sentimento que o dar, tanto vale dá-lo ao pequeno aspecto do meu tinteiro como à grande indiferença das estrelas.

Tudo me interessa e nada me prende. Atendo a tudo sonhando sempre; fixo os mínimos gestos faciais de com quem falo, recolho as entoações milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto, estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção do que nela se disse, da minha parte ou da parte de com quem falei. Assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, pergunto-lhe de novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro palavras fotográficas, o semblante muscular com que ele disse o que me não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com que recebeu a narrativa que me não recordava ter-lhe feito. Sou dois, e ambos têm a distância - irmãos siameses que não estão pegados.

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o!

Tudo se me evapora. A minha vida inteira, as minhas recordações, a minha imaginação e o que contém, a minha personalidade, tudo se me evapora. Continuamente sinto que fui outro, que senti outro, que pensei outro. Aquilo a que assisto é um espectáculo com outro cenário. E aquilo a que assisto sou eu.

Substitui-te sempre a ti - próprio. Tu não és bastante para ti. Sê sempre imprevenido [?] por ti - próprio. Acontece-te perante ti - próprio. Que as tuas sensações sejam meros acasos, aventuras que te acontecem. Deves ser um universo sem leis para poderes ser superior

favoritas Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver. Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos que já se acabaram. As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos. Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará. Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira.

Aqui está-se sossegado Aqui está-se sossegado, Longe do mundo e da vida, Cheio de não ter passado, Até o futuro se olvida. Aqui está-se sossegado. Tinha os gestos inocentes, Seus olhos riam no fundo. Mas invisíveis serpentes Faziam-a ser do mundo. Tinha os gestos inocentes. Aqui tudo é paz e mar. Que longe a vista se perde Na solidão a tornar Em sombra o azul que é verde! Aqui tudo é paz e mar. Sim, poderia ter sido... Mas vontade nem razão O mundo têm conduzido A prazer ou conclusão. Sim, poderia ter sido... Agora não esqueço e sonho. Fecho os olhos, oiço o mar E de ouvi-lo bem, suponho Que veio azul a esverdear. Agora não esqueço e sonho. Não foi propósito, não. Os seus gestos inocentes Tocavam no coração Como invisíveis serpentes. Não foi propósito, não. Durmo, desperto e sozinho. Que tem sido a minha vida? Velas de inútil moinho — Um movimento sem lida... Durmo, desperto e sozinho. Nada explica nem consola. Tudo está certo depois. Mas a dor que nos desola, A mágoa de um não ser dois Nada explica nem consola.

As nuvens são sombrias As nuvens são sombrias Mas, nos lados do sul, Um bocado do céu É tristemente azul. Assim, no pensamento, Sem haver solução, Há um bocado que lembra Que existe o coração. E esse bocado é que é A verdade que está A ser beleza eterna Para além do que há.

Cai chuva. É noite. Uma pequena brisa Cai chuva. É noite. Uma pequena brisa, Substitui o calor. Pra ser feliz tanta coisa é precisa. Este luzir é melhor. O que é a vida? O espaço é alguém pra mim. Sonhando sou eu só. A luzir, em quem não tem fim E, sem querer, tem dó. Extensa, leve, inútil passageira, Ao roçar por mim traz Uma ilusão de sonho, em cuja esteira A minha vida jaz. Barco indelével pelo espaço da alma, Luz da candeia além Da eterna ausência da ansiada calma, Final do inútil bem. Que, se quer, e, se veio, se desconhece Que, se for, seria O tédio de o haver... E a chuva cresce Na noite agora fria.

Amo por que te amo e sei que por amor te amo

É preciso ser um realista para descobrir a realidade. É preciso ser um romântico para criá-la.

Tudo vale a pena,se a alma não for pequena.

E afinal o que quero é fé, é calma, e não ter essas sensações confusas.

A criança que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou. Mas hoje, vendo que o que sou é nada, Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Quem inventou o amor explique-me por favor ?

Navegar preciso, viver não é preciso

Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor

Quanto mais fundamente penso, mais profundamente me descompreendo.

Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?

Dorme, que a Vida é Nada! Dorme, que a vida é nada! Dorme, que tudo é vão! Se alguém achou a estrada, Achou-a em confusão, Com a alma enganada. Não há lugar nem dia Para quem quer achar, Nem paz nem alegria Para quem, por amar, Em quem ama confia. Melhor entre onde os ramos Tecem docéis sem ser Ficar como ficamos, Sem pensar nem querer, Dando o que nunca damos.

Notas para uma Regra de Vida 1. Cada um de nós não tem de seu nem de real senão a sua própria individualidade. 2. Aumentar é aumentar-se. 3. Invadir a individualidade alheia é, além de contrário ao princípio fundamental, contrário (por isso mesmo também) a nós mesmos, pois invadir é sair de si, e ficamos sempre onde ganhamos (Por isso o criminoso é um débil, e o chefe um escravo.) (O verdadeiro forte é um despertador, nos outros, de energias deles. O verdadeiro mestre é um mestre de o não acompanharem.) 4. Atrair os outros a si é, ainda assim, o sinal da individualidade.

O Sonho é a Pior das Cocaínas O sonho é a pior das cocaínas, porque é a mais natural de todas. Assim se insinua nos hábitos com a facilidade que uma das outras não tem, se prova sem se querer, como um veneno dado. Não dói, não descora, não abate – mas a alma que dele usa fica incurável, porque não há maneira de se separar do seu veneno, que é ela mesma.

Quero mais chão, pouco vão e mais bolinhas de sabão. Quero aceitar menos, indagar mais, ousar mais. Experimentar mais. Quero menos “mas”. Quero não sentir tanta saudade. Quero mais e tudo o mais. E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha

Flui, indeciso na bruma Flui, indeciso na bruma, Mais do que a bruma indeciso, Um ser que é coisa a achar E a quem nada é preciso. Quer somente consistir No nada que o cerca ao ser, Um começo de existir Que acabou antes de o Ter. É o sentido que existe Na aragem que mal se sente E cuja essência consiste Em passar incertamente.

Enquanto não encerramos um capítulo, não podemos partir para o próximo. Por isso é tão importante deixar certas coisas irem embora, soltar, desprender-se. As pessoas precisam entender que ninguém está jogando com cartas marcadas, às vezes ganhamos e às vezes perdemos.

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

Ah, verdadeiramente a deusa… Ah, verdadeiramente a deusa! A que ninguém viu sem amar E que já o coração endeusa Só com somente a adivinhar. Por fim magnânima aparece Naquela perfeição que é Uma estátua que a vida aquece E faz da mesma vida fé. Ah, verdadeiramente aquela Com que no túmulo do mundo O morto sonho, como a estrela Que há-de surgir no céu profundo.

O que me dói não é O que há no coração Mas essas coisas lindas Que nunca existirão… São as formas sem forma Que passam sem que a dor As possa conhecer Ou as sonhar o amor. São como se a tristeza Fosse árvore e, uma a uma, Caíssem suas folhas Entre o vestígio e a bruma.

Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito E a cor das flores é transparente de as velas de grandes navios Que largam do cais arrastando nas águas por sombra Os vultos ao sol daquelas árvores antigas… O porto que sonho é sombrio e pálido E esta paisagem é cheia de sol deste lado… Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol… Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo… O vulto do cais é a estrada nítida e calma Que se levanta e se ergue como um muro, E os navios passam por dentro dos troncos das árvores Com uma horizontalidade vertical, E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro… Não sei quem me sonho… Súbito toda a água do mar do porto é transparente E vejo no fundo, como uma estampa enorme que lá estivesse desdobrada, Esta paisagem toda, renque de árvore, estrada a arder em aquele porto, E a sombra duma nau mais antiga que o porto que passa Entre o meu sonho do porto e o meu ver esta paisagem E chega ao pé de mim, e entra por mim dentro, E passa para o outro lado da minha alma…

Se eu morrer novo, sem poder publicar livro nenhum Sem ver a cara que têm os meus versos em letra impressa, Peço que, se se quiserem ralar por minha causa, Que não se ralem. Se assim aconteceu, assim está certo. Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos, Eles lá terão a sua beleza, se forem belos. Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir, Porque as raízes podem estar debaixo da terra Mas as flores florescem ao ar livre e à vista. Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir. Se eu morrer muito novo, oiçam isto: Nunca fui senão uma criança que brincava. Fui gentio como o sol e a água, De uma religião universal que só os homens não têm. Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma, Nem procurei achar nada, Nem achei que houvesse mais explicação Que a palavra explicação não ter sentido nenhum. Não desejei senão estar ao sol ou à chuva - Ao sol quando havia sol E à chuva quando estava chovendo (E nunca a outra cousa), Sentir calor e frio e vento, E não ir mais longe. Uma vez amei, julguei que me amariam, Mas não fui amado. Não fui amado pela única grande razão - Porque não tinha que ser. Consolei-me voltando ao sol e a chuva, E sentando-me outra vez a porta de casa. Os campos, afinal, não são tão verdes para os que são amados Como para os que o não são. Sentir é estar distraído.

Num meio-dia de Primavera Tive um sonho como uma fotografia. Vi Jesus Cristo descer à terra. Veio pela encosta de um monte Tornado outra vez menino, A correr e a rolar-se pela erva E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se longe. Tinha fugido do céu. Era nosso demais para fingir De segunda pessoa da Trindade. No céu tudo era falso, tudo em desacordo Com flores e árvores e pedras. No céu tinha que estar sempre sério E de vez em quando de se tornar outra vez homem E subir para a cruz, e estar sempre a morrer Com uma coroa toda à roda de espinhos E os pés espetados por um prego com cabeça, E até com um trapo à roda da cintura Como os pretos nas ilustrações. Nem sequer o deixavam ter pai e mãe Como as outras crianças. O seu pai era duas pessoas - Um velho chamado José, que era carpinteiro, E que não era pai dele; E o outro pai era uma pomba estúpida, A única pomba feia do mundo Porque nem era do mundo nem era pomba. E a sua mãe não tinha amado antes de o ter. Não era mulher: era uma mala Em que ele tinha vindo do céu. E queriam que ele, que só nascera da mãe, E que nunca tivera pai para amar com respeito, Pregasse a bondade e a justiça! Um dia que Deus estava a dormir E o Espirito Santo andava a voar, Ele foi à caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro fez com que ninguém soubesse que ele tinha fugido. Com o segundo criou-se eternamente humano e menino. Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado na cruz que há no céu E serve de modelo às outras. Depois fugiu para o sol E desceu no primeiro raio que apanhou. Hoje vive na minha aldeia comigo. É uma criança bonita de riso e natural. Limpa o nariz ao braço direito, Chapinha nas poças de água, Colhe as flores e gosta delas e esquece-as. Atira pedras aos burros, Rouba a fruta dos pomares E foge a chorar e a gritar dos cães. E, porque sabe que elas não gostam E porque toda a gente acha graça, Corre atrás das raparigas Que vão em ranchos pelas estradas Com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias. A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando agente as tem na mão E olha devagar para elas. Diz-me muito mal de Deus. Diz que ele é um velho estúpido e doente, Sempre a escarrar para o chão E a dizer indecências. A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia. E o Espirito Santo coça-se com o bico E empoleira-se nas cadeiras e suja-as. Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica. Diz-me que Deus não percebe nada Das coisas que criou - Se é que ele as criou, do que duvido. - Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória, Mas os seres não cantam nada. Se cantassem seriam cantores. Os seres existem e mais nada, E por isso se chamam seres. E depois, cansado de dizer mal de Deus, O Menino Jesus adormece nos meus braços E eu levo-o ao colo para casa. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava. Ele é humano que é natural. Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza Que ele é o Menino Jesus verdadeiro. E a criança tão humana que é divina É a minha quotidiana vida de poeta, E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre. E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo. A Criança Nova que habita onde vivo Dá-me uma mão a mim E outra a tudo que existe E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando e cantando e rindo E gozando o nosso segredo comum Que é saber por toda a parte Que não há mistério no mundo E que tudo vale a pena. A Criança Eterna acompanha-me sempre. A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando. O meu ouvido atento alegremente a todos os sons São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas. Damo-nos tão bem um com o outro Na companhia de tudo Que nunca pensamos um no outro, Mas vivemos juntos e dois Com um acordo íntimo Como a mão direita e a esquerda. Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas No degrau da porta de casa, Graves como convém a um deus e a um poeta, E como se cada pedra Fosse todo o universo E fosse por isso um grande perigo para ela Deixá-la cair no chão. Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens E ele sorri porque tudo é incrível. Ri dos reis e dos que não são reis, E tem pena de ouvir falar das guerras, E dos comércios, e dos navios Que ficam fumo no ar dos altos mares. Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade Que uma flor tem ao florescer E que anda com a luz do Sol A variar os montes e os vales E a fazer doer aos olhos os muros caiados. Depois ele adormece e eu deito-o. Levo-o ao colo para dentro de casa E deito-o, despindo lentamente E como seguindo um ritual muito limpo E todo materno até ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma E às vezes acorda de noite E brinca com os meus sonhos. Vira uns de pernas para o ar, Põe uns em cima dos outros E bate palmas sozinho Sorrindo para o meu sono. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... Quando eu morrer, filhinho, Seja eu a criança, o mais pequeno. Pega-me tu ao colo E leva-me para dentro da tua casa. Despe o meu ser cansado e humano E deita-me na tua cama. E conta-me histórias, caso eu acorde, Para eu tornar a adormecer. E dá-me sonhos teus para eu brincar Até que nasça qualquer dia Que tu sabes qual é. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... Esta é a história do meu Menino Jesus. Por que razão que se perceba Não há-de ser ela mais verdadeira Que tudo quanto os filósofos pensam E tudo quanto as religiões ensinam ?

TABACARIA Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. Janelas do meu quarto, Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é (E se soubessem quem é, o que saberiam?), Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente, Para uma rua inacessível a todos os pensamentos, Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres, Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada. Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer, E não tivesse mais irmandade com as coisas Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada De dentro da minha cabeça, E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida. Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu. Estou hoje dividido entre a lealdade que devo À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro. Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. A aprendizagem que me deram, Desci dela pela janela das traseiras da casa. Fui até ao campo com grandes propósitos. Mas lá encontrei só ervas e árvores, E quando havia gente era igual à outra. Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar? Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que penso? Mas penso tanta coisa! E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos! Gênio? Neste momento Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu, E a história não marcará, quem sabe?, nem um, Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras. Não, não creio em mim. Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas! Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo? Não, nem em mim... Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando? Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas - Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -, E quem sabe se realizáveis, Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente? O mundo é para quem nasce para o conquistar E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão. Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez. Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo, Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu. Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda, Ainda que não more nela; Serei sempre o que não nasceu para isso; Serei sempre só o que tinha qualidades; Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta, E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira, E ouviu a voz de Deus num poço tapado. Crer em mim? Não, nem em nada. Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo, E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha. Escravos cardíacos das estrelas, Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama; Mas acordamos e ele é opaco, Levantamo-nos e ele é alheio, Saímos de casa e ele é a terra inteira, Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido. (Come chocolates, pequena; Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates. Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria. Come, pequena suja, come! Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes! Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho, Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.) Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei A caligrafia rápida destes versos, Pórtico partido para o Impossível. Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas, Nobre ao menos no gesto largo com que atiro A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas, E fico em casa sem camisa. (Tu que consolas, que não existes e por isso consolas, Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva, Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta, Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida, Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua, Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais, Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê - Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire! Meu coração é um balde despejado. Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco A mim mesmo e não encontro nada. Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta. Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam, Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam, Vejo os cães que também existem, E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo, E tudo isto é estrangeiro, como tudo.) Vivi, estudei, amei e até cri, E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu. Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira, E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso); Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente Fiz de mim o que não soube E o que podia fazer de mim não o fiz. O dominó que vesti era errado. Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me. Quando quis tirar a máscara, Estava pegada à cara. Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido. Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado. Deitei fora a máscara e dormi no vestiário Como um cão tolerado pela gerência Por ser inofensivo E vou escrever esta história para provar que sou sublime. Essência musical dos meus versos inúteis, Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse, E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte, Calcando aos pés a consciência de estar existindo, Como um tapete em que um bêbado tropeça Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada. Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta. Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada E com o desconforto da alma mal-entendendo. Ele morrerá e eu morrerei. Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos. A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também. Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta, E a língua em que foram escritos os versos. Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu. Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas, Sempre uma coisa defronte da outra, Sempre uma coisa tão inútil como a outra, Sempre o impossível tão estúpido como o real, Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície, Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra. Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?) E a realidade plausível cai de repente em cima de mim. Semiergo-me enérgico, convencido, humano, E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário. Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos. Sigo o fumo como uma rota própria, E gozo, num momento sensitivo e competente, A libertação de todas as especulações E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto. Depois deito-me para trás na cadeira E continuo fumando. Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando. (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira Talvez fosse feliz.) Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela. O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?). Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica. (O Dono da Tabacaria chegou à porta.) Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me. Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

Adiamento Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã... Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã, E assim será possível; mas hoje não... Não, hoje nada; hoje não posso. A persistência confusa da minha subjetividade objetiva, O sono da minha vida real, intercalado, O cansaço antecipado e infinito, Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico... Esta espécie de alma... Só depois de amanhã... Hoje quero preparar-me, Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte... Ele é que é decisivo. Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos... Amanhã é o dia dos planos. Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o mundo; Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã... Tenho vontade de chorar, Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro... Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo. Só depois de amanhã... Quando era criança o circo de domingo divertia-rne toda a semana. Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância... Depois de amanhã serei outro, A minha vida triunfar-se-á, Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático Serão convocadas por um edital... Mas por um edital de amanhã... Hoje quero dormir, redigirei amanhã... Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância? Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã, Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo... Antes, não... Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei. Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser. Só depois de amanhã... Tenho sono como o frio de um cão vadio. Tenho muito sono. Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã... Sim, talvez só depois de amanhã... O porvir... Sim, o porvir...

De tudo, ficaram três coisas: A certeza de que estamos sempre começando... A certeza de que precisamos continuar... A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar.... Portanto devemos: Fazer da interrupção um caminho novo ... Da queda um passo de dança... Do medo, uma escada... Do sonho, uma ponte... Da procura, um encontro...

Não há saudades mais dolorosas do que as das coisas que nunca foram.

Afinal, se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo!

De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos.

O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela.

Considerar a nossa maior angustia como um incidente sem importância ñ só na vida do universo,mas é o principio da sabedoria...

…Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto, E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá, Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.

Os deuses amam os que morrem jovens porque o absoluto é a sua medida.

Sonho. Não sei quem sou neste momento. Durmo sentindo-me. Na hora calma Meu pensamento esquece o pensamento, Minha alma não tem alma.

Feliz quem não exige da vida mais do que ela espontaneamente lhe dá, guiando-se pelo instinto dos gatos, que buscam o sol quando há sol.

Quero aceitar menos, indagar mais, ousar mais. E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.

O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio qualquer terra larga tem, mas onde estará o palácio se não o ficarem ali?

Acontece-me às vezes, e sempre que acontece é quase de repente, surgir-me no meio das sensações um cansaço tão terrível da vida que não há sequer hipótese de ato com que dominá-lo.

Amo como ama o amor Não conheço nenhuma outra razão para amar do que amar.

Meus amigos são todos assim: metade loucura, outra metade santidade. Escolho-os não pela pele, mas pela pupila, que tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. Escolho meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta. Não quero só o ombro ou o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto...

o sino da minha aldeia O sino da minha aldeia, Dolente na tarde calma, Cada tua badalada Soa dentro de minha alma. E é tão lento o teu soar, Tão como triste da vida, Que já a primeira pancada Tem o som de repetida. Por mais que me tanjas perto Quando passo, sempre errante, És para mim como um sonho. Soas-me na alma distante. A cada pancada tua, Vibrante no céu aberto, Sinto mais longe o passado, Sinto a saudade mais perto.

A maioria pensa com a sensibilidade, eu sinto com o pensamento. Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar.

Os críticos podem dizer que determinado poema, longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos pois que conservar o dia bom em memória florida e prolixa, e assim constelar de novas flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e passageira.

Sou minha própria paisagem; Assisto à minha passagem, diverso, móbil e só, não sei sentir-me onde estou. Por isso, alheio, vou lendo como páginas, meu ser. O que segue não prevendo, o que passou a esquecer. Noto à margem do que li o que julguei que senti. Releio e digo : Fui eu ? Deus sabe, porque o escreveu.

Enquanto não encerramos um capítulo, não podemos partir para o próximo. Por isso é tão importante deixar certas coisas irem embora, soltar, desprender-se. As pessoas precisam entender que ninguém está jogando com cartas marcadas, às vezes ganhamos e às vezes perdemos. Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é.

Não tenhas nada nas mãos Nem uma memória na alma, Que quando te puserem Nas mãos o óbolo último, Ao abrirem-te as mãos Nada te cairá. Que trono te querem dar Que Átropos to não tire? Que louros que não fanem Nos arbítrios de Minos? Que horas que te não tornem Da estatura da sombra Que serás quando fores Na noite e ao fim da estrada. Colhe as flores mas larga-as, Das mãos mal as olhaste. Senta-te ao sol. Abdica E sê rei de ti próprio.

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

INSÔNIA Não durmo, nem espero dormir. Nem na morte espero dormir. Espera-me uma insónia da largura dos astros, E um bocejo inútil do comprimento do mundo. Não durmo; não posso ler quando acordo de noite, Não posso escrever quando acordo de noite, Não posso pensar quando acordo de noite — Meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite! Ah, o ópio de ser outra pessoa qualquer! Não durmo, jazo, cadáver acordado, sentindo, E o meu sentimento é um pensamento vazio. Passam por mim, transtornadas, coisas que me sucederam — Todas aquelas de que me arrependo e me culpo; Passam por mim, transtornadas, coisas que me não sucederam — Todas aquelas de que me arrependo e me culpo; Passam por mim, transtornadas, coisas que não são nada, E até dessas me arrependo, me culpo, e não durmo. Não tenho força para ter energia para acender um cigarro. Fito a parede fronteira do quarto como se fosse o universo. Lá fora há o silêncio dessa coisa toda. Um grande silêncio apavorante noutra ocasião qualquer, Noutra ocasião qualquer em que eu pudesse sentir. Estou escrevendo versos realmente simpáticos — Versos a dizer que não tenho nada que dizer, Versos a teimar em dizer isso, Versos, versos, versos, versos, versos… Tantos versos… E a verdade toda, e a vida toda fora deles e de mim! Tenho sono, não durmo, sinto e não sei em que sentir. Sou uma sensação sem pessoa correspondente, Uma abstracção de autoconsciência sem de quê, Salvo o necessário para sentir consciência, Salvo — sei lá salvo o quê… Não durmo. Não durmo. Não durmo. Que grande sono em toda a cabeça e em cima dos olhos e na alma! Que grande sono em tudo excepto no poder dormir! Ó madrugada, tardas tanto… Vem… Vem, inutilmente, Trazer-me outro dia igual a este, a ser seguido por outra noite igual a esta… Vem trazer-me a alegria dessa esperança triste, Porque sempre és alegre, e sempre trazes esperança, Segundo a velha literatura das sensações. Vem, traz a esperança, vem, traz a esperança. O meu cansaço entra pelo colchão dentro. Doem-me as costas de não estar deitado de lado. Se estivesse deitado de lado doíam-me as costas de estar deitado de lado. Vem, madrugada, chega! Que horas são? Não sei. Não tenho energia para estender uma mão para o relógio, Não tenho energia para nada, para mais nada… Só para estes versos, escritos no dia seguinte. Sim, escritos no dia seguinte. Todos os versos são sempre escritos no dia seguinte. Noite absoluta, sossego absoluto, lá fora. Paz em toda a Natureza. A Humanidade repousa e esquece as suas amarguras. Exactamente. A Humanidade esquece as suas alegrias e amarguras. Costuma dizer-se isto. A Humanidade esquece, sim, a Humanidade esquece, Mas mesmo acordada a Humanidade esquece. Exactamente. Mas não durmo.

(...) O sonho que nos promete o impossível já nisso nos priva dele, mas o sonho que nos promete o possível intromete-se com a própria vida e delega nela a sua solução. Um vive exclusivo e independente; o outro submisso das contingências do que acontece.

NÃO: Não quero nada. Já disse que não quero nada. Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer. (...) Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade. Assim, como sou, tenham paciência! Vão para o diabo sem mim, Ou deixem-me ir sozinho para o diabo! Para que havemos de ir juntos?

Quero tudo novo de novo. Quero não sentir medo. Quero me entregar mais, me jogar mais, amar mais. Viajar até cansar. Quero sair pelo mundo. Quero fins de semana de praia. Aproveitar os amigos e abraçá-los mais. Quero ver mais filmes, ler mais. Sair mais. Quero não me atrasar tanto, nem me preocupar tanto. Quero morar sozinha, quero ter momentos de paz. Sorrir mais, chorar menos e ajudar mais. Quero ser feliz, quero sossego. Quero me olhar mais. Tomar mais sol e mais banho de chuva. Preciso me concentrar mais, delirar mais. Não quero esperar mais. Quero fazer mais, suar mais, cantar mais e mais. Quero conhecer mais pessoas. Quero olhar para frente. Quero pedir menos desculpas, sentir menos culpa. Quero mais chão, pouco vão e mais bolinhas de sabão. Quero ousar mais. Experimentar mais. Quero menos ‘mas’. Quero não sentir tanta saudade. Quero mais e tudo o mais. E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.

Quero seguir o caminho doha cem por centos aparti desta data.

A Decadência é a perda total da inconsciência; porque a inconsciência é o fundamento da vida. O coração, se pudesse pensar, pararia.

Cada coisa é o que é, e é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, E quanto isso me basta.

O valor das coisas não esta no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicaveis e pessoas incomparaveis.

Ser feliz é encontrar força no perdão, esperanças nas batalhas, segurança no palco do medo, amor nos desencontros. É agradecer a Deus a cada minuto pelo milagre da vida.

... Sinto-me nascido a cada momento para a eterna novidade do mundo...

Tudo o que e bom dura o tempo necessário para ser inesquecível

Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Afinal se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo!

Mais vale ser criança que querer compreender o mundo

Ah, não há saudades mais dolorosas do que as das coisas que nunca foram!

Passar pelas suas alegrias e angústias como quem passa por quem não lhe interessa.

Agir,eis a inteligência verdadeira. Serei o quiser. Mas tenho que querer o que for...

[...] Mas imperfeito é tudo, nem há poente tão belo que o não pudesse ser mais, ou brisa leve que nos dê sono que não pudesse dar-nos um sono mais calmo ainda. E assim, contempladores iguais das montanhas e das estátuas, gozando os dias como os livros, sonhando tudo, sobretudo, para o converter na nossa íntima substância, faremos também descrições e análises, que, uma vez feitas, passarão a ser coisas alheias, que podemos gozar como se viessem na tarde. Não é este o conceito dos pessimistas, como aquele de Vigny, para quem a vida é uma cadeia, onde ele tecia palha para se distrair. Ser pessimista é tomar qualquer coisa como trágico, e essa atitude é um exagero e um incómodo. Não temos, é certo, um conceito de valia que apliquemos à obra que produzimos. Produzimo-la, é certo, para nos distrair, porém não como o preso que tece a palha, para se distrair do Destino, senão da menina que borda almofadas, para se distrair, sem mais nada. Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde ela me levará, porque não sei nada. Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cômodas até mim. Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero. Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la, e não interrogo mais nem procuro. Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também.

Mas há mais alguma coisa... Nessas horas lentas e vazias, sobe-me da alma à mente uma tristeza de todo o ser, a amargura de tudo ser ao mesmo tempo uma sensação minha e uma coisa externa, que não está em meu poder alterar.

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se se for preciso... Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se achá-lo, segure-o! Circunda-te de rosas... Ame... Beba... Ria... O mais é nada!

Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver. Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos que já se acabaram. As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se. Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos. Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará. Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida. Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és.. E lembra-te : “Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão”

Quero ser o teu amor amigo. Nem demais e nem de menos. Nem tão longe e nem tão perto. Na medida mais precisa que eu puder. Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida, Da maneira mais discreta que eu souber. Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar. Sem forçar tua vontade. Sem falar, quando for hora de calar. E sem calar, quando for hora de falar. Nem ausente, nem presente por demais. Simplesmente, calmamente, ser-te paz. É bonito ser amor amigo, mas confesso é tão difícil aprender! E por isso eu te suplico paciência. Vou encher este teu rosto de lembranças, Dá-me tempo, de acertar nossas distâncias...

NÃO SE ACOSTUME COM O QUE NÃO O FAZ FELIZ , revolte-se quando julgar necessário.Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.Se achar que precisa voltar, VOLTE!Se perceber que precisa seguir, SIGA!Se estiver tudo errado, COMECE NOVAMENTE.Se estiver tudo certo, CONTINUE.Se sentir saudades, MATE-A.Se perder um amor, NÃO SE PERCA!Se achá-lo, SEGURE-O!

Num meio-dia de fim de primavera eu tive um sonho como uma fotografia: eu vi Jesus Cristo descer à Terra. Ele veio pela encosta de um monte, mas era outra vez menino, a correr e a rolar-se pela erva A arrancar flores para deitar fora, e a rir de modo a ouvir-se de longe. Ele tinha fugido do céu. Era nosso demais pra fingir-se de Segunda pessoa da Trindade. Um dia que DEUS estava dormindo e o Espírito Santo andava a voar, Ele foi até a caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro Ele fez com que ninguém soubesse que Ele tinha fugido; com o segundo Ele se criou eternamente humano e menino; e com o terceiro Ele criou um Cristo eternamente na cruz e deixou-o pregado na cruz que há no céu e serve de modelo às outras. Depois Ele fugiu para o Sol e desceu pelo primeiro raio que apanhou. Hoje Ele vive na minha aldeia, comigo. É uma criança bonita, de riso natural. Limpa o nariz com o braço direito, chapinha nas poças dágua, colhe as flores, gosta delas, esquece. Atira pedras aos burros, colhe as frutas nos pomares, e foge a chorar e a gritar dos cães. Só porque sabe que elas não gostam, e toda gente acha graça, Ele corre atrás das raparigas que levam as bilhas na cabeça e levanta-lhes a saia. A mim, Ele me ensinou tudo. Ele me ensinou a olhar para as coisas. Ele me aponta todas as cores que há nas flores e me mostra como as pedras são engraçadas quando a gente as tem na mão e olha devagar para elas. Damo-nos tão bem um com o outro na companhia de tudo que nunca pensamos um no outro. Vivemos juntos os dois com um acordo íntimo, como a mão direita e a esquerda. Ao anoitecer nós brincamos as cinco pedrinhas no degrau da porta de casa. Graves, como convém a um DEUS e a um poeta. Como se cada pedra fosse todo o Universo e fosse por isso um perigo muito grande deixá-la cair no chão. Depois eu lhe conto histórias das coisas só dos homens. E Ele sorri, porque tudo é incrível. Ele ri dos reis e dos que não são reis. E tem pena de ouvir falar das guerras e dos comércios. Depois Ele adormece e eu o levo no colo para dentro da minha casa, deito-o na minha cama, despindo-o lentamente, como seguindo um ritual todo humano e todo materno até Ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma. Às vezes Ele acorda de noite, brinca com meus sonhos. Vira uns de pena pro ar, põe uns por cima dos outros, e bate palmas, sozinho, sorrindo para os meus sonhos. Quando eu morrer, Filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno, pega-me Tu ao colo, leva-me para dentro a Tua casa. Deita-me na tua cama. Despe o meu ser, cansado e humano. Conta-me histórias caso eu acorde para eu tornar a adormecer, e dá-me sonhos Teus para eu brincar.

Quem você ama é a maior jóia que você possui, a mais valiosa. Não importa se a estação do ano muda, se o século vira e se o milênio é outro, se a idade aumenta; conserve a vontade de viver, não se chega à parte alguma sem ela. Abra todas as janelas que encontrar e as portas também. Persiga um sonho, mas não deixe ele viver sozinho. Alimente sua alma com amor, cure suas feridas com carinho.... Procure os seus caminhos, mas não magoe ninguém nessa procura. Arrependa-se, volte atrás, peça perdão! Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se achá-lo, segure-o! “Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. O mais é nada”.

Se achar que precisa voltar, volte. Se perceber que precisa seguir, siga. Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudade, mate-a. Se perder um amor, não se perca. Se achá-lo, segure-o.

Quando eu não te tinha Amava a natureza como um monge calmo a Cristo... Agora amo a natureza como um monge calmo a Virgem Maria... Religiosamente, a meu modo, como antes, Mas de outra maneira, mais comovida e mais próxima... Vejo melhor os rios quando vou contigo Pelos campos à beira dos rios; Sentado a teu lado reparando nas nuvens Reparo nelas melhor... Tu não me tiraste a natureza... Tu mudaste a Natureza... Trouxeste a Natureza para o pé de mim. Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais, Porque tu me escolhestes para te ter e te amar, Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente Sobre todas as coisas. Não me arrependo do que fui outrora Porque ainda o sou...

Ai que prazer não cumprir um dever. Ter um livro para ler e não o fazer! Ler é maçada, estudar é nada. O sol doira sem literatura. O rio corre bem ou mal, sem edição original. E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal como tem tempo, não tem pressa... Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta A distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto melhor é quando há bruma. Esperar por D. Sebastião, Quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças, Flores, música, o luar, e o sol que peca Só quando, em vez de criar, seca. E mais do que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças, Nem consta que tivesse biblioteca...

Quem escreverá a história do que poderia ter sido o irreparável do meu passado; Este é o cadáver. Se a certa altura eu tivesse me voltado para a esquerda, ao invés de para direita; Se em certo momento eu tivesse dito não, ao invés que sim; Se em certas conversas eu tivesse dito as frases que só hoje elaboro; Seria outro hoje, e talvez o universo inteiro seria insensivelmente levado a ser outro tambem...

Não me indigno, porque a indignação é para os fortes; não me resigno, porque a resignação é para os nobres; não me calo, porque o silêncio é para os grandes. E eu não sou forte, nem nobre, nem grande. Sofro e sonho. Queixo-me porque sou fraco e, porque sou artista, entretenho-me a tecer musicais as minhas queixas e a arranjar meus sonhos conforme me parece melhor a minha ideia de os achar belos. Só lamento o não ser criança, para que pudesse crer nos meus sonhos. Eu não sou pessimista, sou triste.

A maior empresa do mundo, é a minha vida...

Já não me importo Já não me importo Até com o que amo ou creio amar. Sou um navio que chegou a um porto E cujo movimento é ali estar. Nada me resta Do que

Tiago,meu filho minha vida!!

“É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou quando menos, os seus companheiros de espírito?

Ser feliz é encontrar força no perdão, esperanças nas batalhas, segurança no palco do medo, amor nos desencontros. É agradecer a Deus a cada minuto pelo milagre da vida. -

O amor é bom, mas é melhor o sono.

Há tanta suavidade em nada dizer e tudo se entender.

Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser um.

AMO COMO AMA O AMOR. NÃO CONHEÇO OUTRA RAZÃO PARA AMAR SENÃO AMAR. QUE QUERES QUE TE DIGA,ÁLEM DE QUE TE AMO,SE O QUE QUERO TE DIZER É QUE TE AMO..

Cai chuva do céu cinzento Que não tem razão de ser. Até o meu pensamento Tem chuva nele a escorrer. Tenho uma grande tristeza Acrescentada à que sinto. Quero dizer-ma mas pesa O quanto comigo minto. Porque verdadeiramente Não sei se estou triste ou não. E a chuva cai levemente (Porque Verlaine consente) Dentro do meu coração.

Eu ja disse, mas vou repetir: Não se represa um rio, Não se engana a natureza, Faça a represa o que quiser, Pois o rio cedo ou tarde vai arranjar um jeito de rasgar a terra, Abrir um caminho, E voltar a correr em seu leito de origem

Há em Tudo que Fazemos. Uma razão singular; É que não é o que queremos. Faz-se porque nós Vivemos. e viver é não pensar. Se alguém pensasse na vida; Morria de pensamento. Por isso a vida vivida É essa coisa esquecida. Entre um momento e um momento. Mas nada importa que o seja Ou até que deixe de o ser Mal é que a moral nos reja. Bom é que ninguém nos veja. Entre isso Fica Viver.

I do not know reason to love you more than love you. What do you want to tell you more than love, If you want to tell you is that love? .................................................. ................... When you talk, it hurts me that respondas To which I say and not to my love. .................................................. ................... Ah! do not ask anything, before I speak Insomuch that, if I was deaf, You hear all the heart. If I see you do not know who I am: I love. If I fault [...] ... But you do, love, for me faltares Even though me, because questions - When should you love. If you do not love, It shows you indifferent or do not want, But thou art like nobody was For search for love is not love, And, if I search, it is as if I were only Someone to tell you who you love. .................................................. ................... When I saw you I loved you long before: Again I find you when I met you. Born to you before the world. There is no thing happy or happy hour I have had in life by That was not because I foresaw, Because You Were Sleeping her future. .................................................. ................... And I knew him only later, when I saw you, And I had the best sense to me, And my background was as a strada Illuminated from the front when The car turns the corner with lanterns The way and now the night is all human. .................................................. ................... When I was little, I feel I loved you as far, but far ... .................................................. ................... Love, says any thing that I feel! - I understand you do not feel well, Oh my heart outside! Fate, daughter of destiny And the laws that are in the bottom of this world! What art thou to me that I understand the point From the feel ...?

O mundo é de quem não sente. A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade. A qualidade principal na prática da vida é aquela qualidade que conduz à acção, isto é, a vontade. Ora há duas coisas que estorvam a acção - a sensibilidade e o pensamento analítico, que não é, afinal, mais que o pensamento com sensibilidade. Toda a acção é, por sua natureza, a projecção da personalidade sobre o mundo externo, e como o mundo externo é em grande e principal parte composto por entes humanos, segue que essa projecção da personalidade é essencialmente o atravessarmo-nos no caminho alhieo, o estorvar, ferir e esmagar os outros, conforme o nosso modo de agir. Para agir é, pois, preciso que nos não figuremos com facilidade as personalidades alheias, as suas dores e alegrias. Quem simpatiza pára. O homem de acção considera o mundo externo como composto exclusivamente de matéria inerte - ou inerte em si mesma, como uma pedra sobre que passa ou que afasta do caminho; ou inerte como um ente humano que, porque não lhe pôde resistir, tanto faz que fosse homem como pedra, pois, como à pedra, ou se afastou ou se passou por cima.

O homem não deve poder ver a sua própria cara. Isso é o que há de mais terrível. A Natureza deu-lhe o dom de não a poder ver, assim como de não poder fitar os seus próprios olhos. Só na água dos rios e dos lagos ele podia fitar seu rosto. E a postura, mesmo, que tinha de tomar, era simbólica. Tinha de se curvar, de se baixar para cometer a ignomínia de se ver. O criador do espelho envenenou a alma humana.

Nem sempre um ponto final é um ponto final. É possível, sempre, começar um novo parágrafo, por isso Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o!

Quero tudo novo de novo. Quero não sentir medo. Quero me entregar mais, me jogar mais, amar mais. Viajar até cansar. Quero sair pelo mundo. Quero fins de semana de praia. Aproveitar os amigos e abraçá-los mais. Quero ver mais filmes, ler mais. Sair mais. Quero não me atrasar tanto, nem me preocupar tanto. Quero morar sozinha, quero ter momentos de paz. Sorrir mais, chorar menos e ajudar mais. Quero ser feliz, quero sossego. Quero me olhar mais. Tomar mais sol e mais banho de chuva. Preciso me concentrar mais, delirar mais. Não quero esperar mais. Quero fazer mais, suar mais, cantar mais e mais. Quero conhecer mais pessoas. Quero olhar para frente. Quero pedir menos desculpas, sentir menos culpa. Quero mais chão, pouco vão e mais bolinhas de sabão. Quero ousar mais. Experimentar mais. Quero menos ”mas”. Quero não sentir tanta saudade. Quero mais e tudo o mais. E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.

VIAJAR! PERDER PAÍSES! Viajar! Perder países! Ser outro constantemente, Por a alma não ter raízes De viver de ver somente! Não pertencer nem a mim! Ir em frente, ir a seguir A ausência de ter um fim, E a ânsia de o conseguir! Viajar assim é viagem. Mas faço-o sem ter de meu Mais que o sonho da passagem. O resto é só terra e céu.

Não tenho a pretensão de que todas as pessoas que gosto, gostem de mim, nem que eu faça a falta que elas me fazem. O importante pra mim é saber que eu, em algum momento, fui insubstituível, e que esse momento será inesquecível.

POEMA 165 Tenho tanto sentimento Que é frequente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida. E outra vida que é pensada. E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada. Qual, porém, é verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.